Pequim, uma cidade desfigurada pela poluição

A densa poluição que há quase uma semana envolve Pequim mudou também a atmosfera sonora da cidade, com as manhãs a tornaram-se subitamente mais silenciosas.

Dentro do regime de “alerta laranja” decretado na sexta-feira passada pelas autoridades locais, pela primeira vez, as escolas do município – mais de 2.000, com cerca de um milhão de alunos – devem suspender as actividades ao ar livre.

Na maioria das escolas, foi mesmo suspensa a tradicional cerimónia do içar da bandeira, que reúne as crianças no pátio logo às 07:30, disse a imprensa oficial.

Quem vive perto de uma escola já não acorda ao som do hino nacional chinês ou dos altifalantes dando as instruções para a ginástica matinal. Mas o ambiente não é propriamente bucólico.

Hoje, às 11.00 (03:00 em Lisboa), no índice sobre a qualidade do ar em Pequim, o nível das partículas PM2.5, as mais susceptíveis de se infiltrarem nos pulmões, situava-se nos 490, muito acima do máximo de 25 microgramas por metro cúbico recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

No âmbito das medidas adoptadas pelo governo municipal para tentar reduzir a poluição, quase 150 empresas industriais limitaram ou suspenderam a produção, mas a atmosfera continuou “seriamente poluída”.

“Chocante bruma” em Pequim, relatou hoje a televisão chinesa, a propósito da persistente poluição.

O “alerta laranja” é o terceiro mais grave numa escala de quatro.

Crianças e idosos devem ficar em casa e, em vez do automóvel, a população é aconselhada a usar transportes públicos.

Seguindo outra recomendação das autoridades, milhares de pessoas passaram a usar máscaras sempre que saem à rua.

Há máscaras de diversas cores e feitios, incluindo cor-de-rosa ou decoradas com bigodes à gato.

Vendem-se nos supermercados e já não apenas nas farmácias. No Taobao, o mais popular portal de comércio online do país, as vendas aumentaram 130% e alguns modelos esgotaram.

Num gesto mais que simbólico, estudantes colocaram máscaras nas estátuas que ornamentam os jardins da Universidade de Pequim.

A poluição, que afecta várias províncias do nordeste da China, tornou-se uma grande fonte de insatisfação popular.

Numa sondagem realizada há um ano em Pequim e seis outras cidades, 60% dos inquiridos apontaram a poluição como uma das “principais ameaças ao desenvolvimento” do país, a seguir à corrupção.

Para a nova liderança chinesa, encabeçada pelo Presidente Xi Jinping, a proteção do ambiente também se tornou uma prioridade. No caso de Pequim, o Governo propõe-se reduzir um quarto das partículas PM2.5 até 2017.

“O Governo central quer resolver o problema, mas a implementação das políticas colide com poderosos interesses instalados”, diz Ma Jun, diretor do Institute of Public and Environment Affairs, organização não-governamental com sede em Pequim.

Há uma semana, em entrevista à agência Lusa, Ma Jun defendeu que a China “precisa de uma grande participação do público para ajudar a resolver o problema da poluição”.

“Os poluidores não têm motivação para mudar. Em vez de resolverem o problema, preferem pagar as multas. É mais barato”, salientou.

Lusa/SOL