BCP na mira da Guiné Equatorial

A Guiné Equatorial está interessada em investir no BCP, uma vez concretizada a compra de 11% do Banif. A entrada no capital do banco deverá ser feita através de um fundo de investimento, estando em estudo uma parceria com investidores angolanos, soube o SOL.

Angola tem sido um aliado fundamental na entrada do país na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). No ano passado, foi José Eduardo dos Santos quem garantiu ao seu homólogo da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, que entraria na organização em 2014. “O Presidente dos Santos assegurou que a Guiné Equatorial vai entrar na próxima reunião”, disse Obiang à imprensa, no final de uma visita a Luanda.

A cooperação crescente entre os dois países produtores de petróleo acentuou-se com a deterioração das relações da Guiné Equatorial com França, o seu parceiro histórico (ler caixa). O novo foco estratégico do país passa por reforçar as ligações com os países da CPLP, sobretudo Angola.

As relações entre os dois países cruzam-se agora em Portugal. A Sonangol, a petrolífera estatal angolana, é o maior accionista do BCP, com uma posição de 19,44%. E a InterOceânico, uma sociedade luso-angolana presidida por Carlos Silva, tem 2,1% do capital do banco. Ainda não é claro de que forma poderá ser concretizado o investimento da Guiné Equatorial. O BCP não comunicou ao mercado qualquer plano de aumento de capital, pelo que a intenção pode passar pela aquisição de acções em bolsa – a maioria do capital do banco (65%) está disperso por accionistas com menos de 2% – ou pela compra de uma posição junto dos actuais accionistas qualificados.

Neste momento, além da Sonangol e da InterOceânico, o banco tem participações qualificadas do banco Sabadell (4,27%), do grupo Berardo (3,06%), da EDP (2,99%) e do grupo Estêvão Neves (2,1%).

Contactado pelo SOL, o BCP diz desconhecer qualquer intenção de compra – que terá de ser comunicada à CMVM, caso ultrapasse os 2% do capital. No caso do Banif, foi assinado um memorando de entendimento que prevê a entrada de uma “empresa da Guiné Equatorial”, cuja designação não foi referida, num investimento que pode ir até 133,5 milhões de euros (11% do capital).

A economia do país é sustentada pelo petróleo e pelo gás, dois sectores que representam mais de 90% do PIB. As maiores empresas estatais são as que operam nesses sectores: a Sonagás e GEPetrol. As duas sociedades têm sido apontadas como as futuras compradoras do Banif, mas há outras possibilidades, uma vez que o país está a constituir novos veículos financeiros para diversificar a economia.

Este mês, o Governo de Obiang anunciou a criação de um fundo de investimento com mil milhões de dólares (cerca de 730 milhões de euros) para captar investidores estrangeiros que, em parceria, invistam em áreas fora do petróleo e do gás.

Segundo o ministro das Finanças do país, Marcelino Owono Edu, o fundo designa-se Holdings Equatorial Guinea 2020 e servirá para atrair capital para sectores como a agricultura, pescas, petroquímica, turismo, minas e serviços financeiros.

O memorando assinado com o Banif, por exemplo, prevê “iniciativas de colaboração no sector bancário em condições que venham a ser acordadas entre as partes”.

O Banco de Portugal, que terá de pronunciar-se sobre a entrada da Guiné no Banif, recusa-se a comentar a questão. Mas, ao que o SOL apurou, o regulador estará perto de pronunciar-se favoravelmente e está já informado das intenções de investimento no BCP. A reserva é também a opção do presidente da Associação Portuguesa de Bancos. Faria de Oliveira disse ao SOL que “não se pronuncia sobre questões dos associados”.

Amado fez a aproximação

A aproximação da Guiné Equatorial ao Banif deu-se depois de anos de estreitamento das relações com Portugal, a nível diplomático e comercial. Luís Amado, hoje presidente do Conselho de Administração do Banif, teve um papel determinante na entrada da Guiné Equatorial na CPLP, que deve ser formalizada na cimeira da organização de Julho, em Díli, Timor, depois de um parecer favorável dos ministros dos Negócios Estrangeiros, na semana passada.

Enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros dos governos de Sócrates, Amado presidiu ao Conselho de Ministros da CPLP, numa altura em que a entrada do país na organização passou à agenda diplomática. Fez uma visita oficial ao país com uma comitiva de empresários e recebeu em Portugal o seu homólogo da Guiné Equatorial.

O país é observador associado da CPLP desde 2006 e fez um pedido formal de adesão há quatro anos. O tema ganhou destaque nas últimas duas cimeiras de chefes de Estado e de Governo da organização: em 2010 em Luanda e em 2012 em Maputo.

Com o actual Governo, a política de aproximação teve continuidade. Em Janeiro, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, Luís Campos Ferreira, fez uma visita de dois dias ao país, com o objectivo de “contribuir para o reforço das relações entre os dois Estados” e assinar protocolos de cooperação. A deslocação implicou contactos com as principais figuras da República da Guiné Equatorial, como o Presidente Obiang, a inauguração de uma exposição alusiva ao fado e um concerto da fadista portuguesa Katia Guerreiro no Centro Cultural de Malabo, capital da Guiné Equatorial.

Isolamento internacional

A aproximação da Guiné Equatorial à CPLP foi aprofundada com o crescente isolamento internacional do país. A pena de morte e as investigações na justiça são motivos de críticas de organizações internacionais. Dois dos principais parceiros comerciais do país, os Estados Unidos e a França, abriram processos contra o filho do Presidente, por suspeitas de fraude fiscal e corrupção, o que causou danos diplomáticos. A presença do país na Comunidade Económica e Monetária da África Central, onde as ex-colónias francesas e a influência de Paris estão em destaque, tornou-se ainda mais distante – já era o único país da organização e de África onde a língua oficial é o espanhol. Para entrar na CPLP, o país teve de suspender a pena de morte e promover o ensino do português.

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