Madeirenses apreensivos com lei do domínio marítimo

Proprietários de casas em Paul do Mar, na zona da Calheta (Madeira) estão a ter dificuldades em provar que já eram donos das suas casas antes de meados do séc. XIX.

Segundo legislação recente, quem vive ou tem propriedades na faixa de 50 metros do litoral tem até 1 de Julho para provar que é dono desse ‘pedacinho’ de território. Se não o fizer, o Estado pode promover a sua desocupação/demolição ou cobrar taxas pela sua utilização (mediante concessão pelo uso privativo).

A questão tem suscitado apreensão em vários pontos do país, mas mais ainda na freguesia do Paul do Mar, na zona da Calheta, na Madeira – onde grande parte das casas estende-se pela faixa dos 50 metros. Os moradores já pediram apoio à Câmara Municipal e ao Governo Regional.

Em causa está a aplicação da Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos que estipula que quem não fizer prova da titularidade privado do espaço antes de meados do séc. XIX, tal espaço passa a ser do Domínio Público Marítimo (DPM). A lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, especifica que se considera “margem” uma faixa de terreno, normalmente 50 metros, “contígua ou sobranceira à linha que limita o leito das águas”.

A referência a 31 de Dezembro de 1864, data em que as parcelas tinham de ser privadas para agora serem reconhecidas como tal, tem a ver com uma lei que então definiu os domínios hídricos públicos e privados. O problema é que a prova implica o reconhecimento de que o espaço em causa já era de domínio privado há mais de 150 anos. Para tal, os proprietários têm de mover contra o Estado uma acção de reconhecimento de propriedade privada. A lei dava um prazo até 1 de Janeiro de 2014, que foi prorrogado pela Assembleia da República até 1 de Julho, precisamente por causa das dificuldades que as populações estão a enfrentar.

No caso das ‘arribas alcantiladas’, muito frequentes na Madeira, a prova da titularidade privada terá de se mostrar anterior a 22 de Março de 1868. Ora, tal titularidade privada é de difícil prova mesmo, para os terrenos que já foram desafectados do DPM por qualquer circunstância ou lei (por exemplo, por legislação regional que desanexou parcelas para o interior de estradas regionais marginais).

Num esclarecimento ontem divulgado, a Secretaria Regional do Ambiente e dos Recursos Naturais – que tem, na Madeira, a tutela do ordenamento do território – veio a público manifestar-se “solidária” com as populações afectadas. Revelou ainda que “discorda veementemente” das leis e procedimentos nacionais e que tem encetado esforços junto do Governo da República, “de forma a encontrar a melhor solução para este problema”.

A Madeira entende que, atendendo às especificidades da Região, a Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos tem de ser adaptada. A Região tem-se batido por isso mesmo, designadamente nas reuniões da Comissão Interministerial para os Assuntos do Mar, a última das quais realizada em Sines, em 16 de Novembro último.

Para contornar a exigência legal e minimizar o impacto negativo do regime jurídico nacional relativo ao DPM, a região tem procedido à reclassificação de estradas marginais, com vista à exclusão da lei dos terrenos aquém das referidas vias (ou seja, passando uma estrada junto à orla costeira, todos os terrenos a montante, ainda que compreendidos nos 50 metros de costa, deixam assim de pertencer ao DPM).

Ontem, após um encontro na Câmara da Calheta com 50 moradores do Paul do Mar, o presidente da Câmara, Carlos Teles, disse que o assunto será levada até às últimas instâncias. “Se for preciso ir a Lisboa, nós vamos. Se for preciso ir a Bruxelas, também iremos”, disse.

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