Almada sabe breakar

O espectáculo, que estreia no TNSJ, no Porto, esta quarta-feira, às 23h30, na véspera do Dia Mundial do Teatro, baseia-se essencialmente em Saltimbancos, texto frenético e sexual de Almada Negreiros, escrito num único período e que ocasionou a apreensão da revista Portugal Futurista, em 1917. Antes, às 20h30, é reposto pela última vez Turismo Infinito,…

O espectáculo, que estreia no TNSJ, no Porto, esta quarta-feira, às 23h30, na véspera do Dia Mundial do Teatro, baseia-se essencialmente em Saltimbancos, texto frenético e sexual de Almada Negreiros, escrito num único período e que ocasionou a apreensão da revista Portugal Futurista, em 1917.

Antes, às 20h30, é reposto pela última vez Turismo Infinito, uma incursão de Ricardo Pais pelo universo de Fernando Pessoa. O fosso entre os dois poetas de Orpheu – onde Pessoa é platónico, Almada é carnal e violento – passa a ter a duração de um pequeno intervalo.

“O Almada era um ginasta, tinha pretensões de dança e a linguagem dele é um desafio à ginástica mental de qualquer actor. Há uma proliferação sensual de corpos e figuras, uma escrita compulsivamente pictórica, enquanto o Turismo Infinito é marcado pelo movimento psíquico. Em al mada nada temos a visualidade mais do que da oralidade, apresentada pelos saltimbancos dos dias de hoje. Um dos b-boys é bielorrusso, há um russo e outro da Martinica”, explica Ricardo Pais.

Em Saltimbancos sucedem-se imagens de uma vila portuguesa à beira-mar, em cujo quartel se preparavam à pressa soldados para participar na I Guerra Mundial, das namoradas que ficam distantes e de um ridículo espectáculo de circo. Trata-se da pobreza nacional, à qual os mundialmente premiados Momentum Crew – “que invertem a lógica do artistinha de teatro português” – dão literalmente corpo: num palco com uma inclinação de 14,2 por cento, realizam acrobacias que só não impressionam um ginasta e que fogem à linguagem habitual do break dance.

A acompanhar estes verdadeiros “atletas de competição” – sem “pretensão de serem artistas” mas com um “respeito venerando” por Ricardo Pais, que o próprio admite – está o percussionista Rui Silva e o actor Pedro Almendra, que entrelaça o texto de Almada com as acrobacias da crew sediada na Rua de Santa Catarina, evitando a mera ilustração e fugindo à história contada. “Não é isso que interessa”, marca o encenador.

Uma família inventada

Num mês mais do que preenchido nos três palcos do TNSJ, o Teatro Carlos Alberto acolheu ontem outra estreia: O Filho de Mil Homens, uma adaptação do romance homónimo de Valter Hugo Mãe de acordo com a visão da encenadora Ana Luena e do Teatro Bruto, em cena até 30 de Março. Aqui mergulha-se na vida de Crisóstomo, um quarentão que inventa a família que não tem.

“Não foi fácil adaptar um texto narrativo, com pouco diálogo, mas não interessa contar a história do romance e sim passar a mensagem da possibilidade da felicidade, da família e do amor”, sublinha Ana Luena. O espectáculo resulta de um longo processo que envolveu laboratórios de criação e interpretação, pelo que há mais de 20 actores, grande parte deles não profissionais. Peixe, ex-guitarrista dos Ornatos Violeta, é responsável pela música original que interpreta ao vivo, orientando ainda o coro que acompanha a trama. Para o próprio Valter Hugo Mãe, o resultado será uma surpresa: “Ele esteve num ensaio, mas não interferiu na adaptação, ao contrário das três peças anteriores que escreveu connosco em residências”.

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