Os filhos da PUB

Longe vão os tempos do restaurador Olex, dos pudins Boca Doce, das peúgas CD ou até do regional ‘Tou xim? É para mim!’, da Telecel. Slogans que corriam na boca de miúdos e graúdos.

Em Portugal, a génese das agências de publicidade está intrinsecamente ligada à resistência. Em anos de ditadura e censura, as primeiras agências tornaram-se uma espécie de porto seguro para artistas plásticos e escritores da oposição. Destas, destaca-se a Êxito, fundada no final dos anos 50 por Fernando d’Almeida e refúgio de neo-realistas como Alves Redol, Ary dos Santos, Sttau Monteiro, Saramago, José Cardoso Pires, Fernando Lopes e António-Pedro Vasconcelos. É destas cabeças que sai o primeiro anúncio português a cores: um filme a uma marca de produtos para campismo. Mas os tempos mudaram. E as vontades também.

O digital é cada vez mais a plataforma de excelência. Além disso, o universo da publicidade é hoje incomensuravelmente maior e dominado por grandes grupos. E Portugal não é excepção – em 2013, apesar de terem surgido algumas pequenas agências, também aconteceram fusões que resultaram em reforços de posição. Mas, com dez milhões de habitantes, Portugal ainda é considerado um país relativamente pequeno para as grandes marcas, o que dita que o mercado publicitário seja reduzido em comparação com uma boa parte dos países europeus.

O ano de 2013 foi bom para a publicidade com assinatura portuguesa. Hugo Veiga e a campanha Retrato da Beleza Real, para a Dove; João Coutinho e a campanha de incentivo à doação de órgãos Fãs Imortais; e Miguel Durão com os chocolates Milka arrecadaram os principais prémios, quer do Festival de Cannes, quer do Eurobest. E realizadores como Cristiana Miranda ou Augusto Fraga continuam a dar cartas e a arrecadar distinções no estrangeiro. No entanto, o cenário é bem diferente para a publicidade desenvolvida em Portugal. Nesse campo, aliás, 2013 foi dos piores anos: Portugal arrecadou apenas um Leão de Bronze em Cannes (para a agência O Escritório com Uma Pequena Demonstração, para o Windows 8) e três prémios no Eurobest (para a Fuel, Partners e O Escritório).

Mas a questão dos prémios está longe de ser vista de forma linear. “O problema é exclusivamente financeiro. As agências portuguesas não têm recursos financeiros para produzir e inscrever campanhas em festivais por esse mundo fora. E os festivais são um negócio de milhões, ganho por quem mais investe. Engana-se quem pensa que é só talento. A publicidade quotidiana no Brasil não é superior à nossa. Mas no ano passado a indústria no Brasil gastou milhões a produzir e inscrever campanhas em Cannes – pelos meus cálculos, mais de 20 milhões de euros só em inscrições. Esse montante é superior aos lucros totais das 15 ou 20 maiores agências portuguesas. Claro, a publicidade brasileira levou para casa mais de uma centena de Leões. E a nossa um”, esclarece Ricardo Monteiro, o português que lidera a Havas Worldwide, o quinto maior grupo de comunicação do mundo. O empresário é um dos portugueses que dão cartas no universo da publicidade mundial, e um dos casos retratados nas próximas páginas.

Por cá, espera-se um ano mais positivo em termos de prémios. E a verdade é que 2014 começou com um sorriso: o filme Funerária Funalcoitão, criado pela BAR e produzido pela Krypton no âmbito do programa da SIC Radical, Filho da Pub, foi considerado o ‘melhor comercial de funerária de todos os tempos’ pela Exame Brasil e é o mais recente fenómeno viral português, contando com mais de 110 mil visualizações no YouTube.

raquel.carrilho@sol.pt