Dito & Feito

João Ferreira, cabeça-de-lista da CDU às eleições europeias, não pára de nos surpreender a cada entrevista que dá. Com ideias anacrónicas de isolacionismo nacional e surrealismo político, parece ter saído directamente de um curso acelerado de formação política em Pyongyang para a pré-campanha das europeias.

No seu delírio geoestratégico, João Ferreira defende «a saída do país do euro» e «o financiamento do Estado com emissão de moeda própria», propõe que «Portugal se desvincule do Tratado de Lisboa» a par da «possibilidade da revogação de outros tratados» que assinámos com a UE e, como não podia deixar de ser, sugere um unilateral «cancelamento de uma parte da dívida» portuguesa. Um perdão parcial da dívida, recusando pagar a quem nos emprestou? Não, «a expressão perdão é desadequada», é preferível falar de «cancelamento» – esclarece.

Este modelo norte-coreano de desvinculação da UE, que levaria rapidamente Portugal a caminho da miséria generalizada, implica, diz João Ferreira, «rupturas» que «pressupõem uma acção concertada com outros países». Quais? Ferreira não é capaz de especificar. Mas sabe que «esta UE é irreformável», e avisa que «este não é o primeiro processo de integração que existe na Europa». Devia estar a pensar no saudoso Comecon do Leste europeu sob tutela soviética, que há 50 anos foi uma bela integração.

Nesta campanha anti-europeia, com laivos de isolacionismo à Kim Jong-un, o PCP parece ter feito recuar o seu discurso aos tempos brejenevianos da ortodoxia mais rígida e canhestra. Com que objectivo?

Mesmo ao falar sobre a esquerda, o extremista Ferreira não se esquece de atacar os socialistas, «gente que tem estado comprometida com políticas de direita», e de esperar «um reforço substancial» do PCP e da CDU, pois «não é possível uma alternativa de esquerda tendo o PS votações de 30% ou 40%». O que levará Jerónimo de Sousa e a direcção do PCP a caucionarem esta retórica lunática e sectária? Têm receio de perder votos para o radicalismo do Bloco de Esquerda? Ou é apenas a velha atracção do PCP pelo lema salazarista do «orgulhosamente sós», com Portugal à margem da Europa?

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