Europa – fronteiras em risco

Dias complicados para a Europa e para o construtivismo europeu: primeiro foi o gesto brutal do vizinho russo, respondendo a um desafio temerário com uma decisão político-militar que implicou a mudança de fronteiras na zona de contacto Mitteleuropa – Ásia Ocidental. É uma zona crucial da geografia histórica europeia, onde os asiáticos avançaram para Ocidente…

Putin altera fronteiras, no ano que, na Europa Ocidental, há dois referendos que podem também alterar fronteiras: um, para decidir a separação ou não da Escócia da Grã-Bretanha; o outro pode levar à quebra da unidade espanhola alcançada pelos Reis Católicos no final do século XV.

O referendo na Grã-Bretanha é legal e de comum acordo: os escoceses são uma ‘nação’, que muito deve da sua identidade aos romances históricos de Walter Scott; o referendo de Setembro é concertado entre Londres e Edimburgo, o resultado é indeciso, mas não parece por agora haver grandes tensões nem acusações de inconstitucionalidade ou ilegalidade. Os escoceses e ingleses falam a mesma língua, querem ambos a libra e os primeiros não têm que se queixar quanto à saída dos seus filhos em Londres. Sete escoceses, entre eles, Balfour, Campbell-Bannerman, Ramsay MacDonald e Gordon Brown, foram primeiros-ministros de Sua Majestade nos últimos 250 anos. O meu palpite é que Londres deixa andar porque os ingleses estão convencidos que ganham.

Não é assim com os catalães: à medida que se aproxima a data do referendo – em Novembro, dois meses depois da Escócia – sobe a tensão entre Barcelona e Madrid. O Parlamento e o Governo espanhóis recusam a constitucionalidade do referendo, mas os partidos independentistas catalães, na expectativa da vitória, querem fazê-lo de qualquer maneira e admitem até quebrar as leis constitucionais. Há um Tribunal Constitucional, mas, como todos os tribunais deste tipo, é um tribunal político e duvida-se que as partes em litígio se acomodem a uma solução jurídica numa questão que é política, de decisão.

Como não bastassem estes problemas nacionalitários e nacionais, a acrescentar à clara humilhação no caso da Ucrânia, os resultados da Frente Nacional nas municipais de 30 de Março em França, vêm confirmar a esperada subida de popularidade dos nacionais-identitários na União Europeia. Do mesmo modo, em 6 de Abril, os húngaros renovaram a confiança no eurocéptico Viktor Orbán.

Marine Le Pen já declarou a UE como o inimigo principal e se a votação do seu partido, em Maio, vier confirmar as expectativas, tal será um golpe importante na arquitectura comunitária. Até por que os dominós funcionam e se a alteração das fronteiras, por razões político-militares ou de decisão popular, continuar a reforçar as tendências nacionalistas no espaço europeu, podem acontecer muitas coisas.

Como há 40 anos.