‘Portugal, o Fim de uma Ditadura’, ‘Libertad en Portugal’, ‘Portugal na Hora da Vitória’, ‘Portugal, o Poder Anônimo dos Capitães’, ‘Portugal: le Coup Communiste’, ‘The Blossoming of the Revolution of Flowers’, ‘Portugal: Le Chaos et la Peur’, ‘Lisbon’s Troika: Red Threat in Portugal’, ‘Portugal: L’Armée Face à L’Anticommunisme’.
Francês, inglês, italiano, castelhano, português do Brasil… A pluralidade de línguas espelha a multiplicidade de olhares que, durante 19 meses – entre o 25 de Abril de 1974 e o 25 de Novembro de 1975 -, se focaram em Portugal. A história da revolução dos cravos fez-se também nas páginas da imprensa internacional. Portugal ‘tomou de assalto’ revistas e jornais, abriu noticiários televisivos e radiofónicos. Nunca, no passado ou no futuro, Portugal ocupou tantas manchetes internacionais como nesse período. De repente, o mundo passou a estar atento a um pequeno país chamado Portugal. «Ninguém estava à espera que num país de uma Europa estável se desenvolvesse um processo revolucionário desta natureza. Foi não só a natureza progressista do movimento dos capitães mas também a euforia revolucionária que se seguiu a surpreender toda a gente e a atrair inúmeros estrangeiros a Portugal, sobretudo aqueles que não conseguiam fazer a revolução nos seus países e achavam que a podiam fazer aqui. Antes, só tinha acontecido coisa idêntica com o Maio de 68 em França, mas durou poucas semanas», explica o jornalista e escritor Joaquim Vieira, co-autor, com o professor de História e investigador suíço Reto Monico, de Nas Bocas do Mundo – O 25 de Abril e o PREC na Imprensa Internacional (ed. Tinta-da-China).
A dupla já havia trabalhado junta em Mataram o Rei! – O Regicídio na Imprensa Internacional (2007) e, dois anos mais tarde, em República em Portugal! – O 5 de Outubro Visto pela Imprensa Internacional. Depois destas duas obras, a dupla concluiu que havia apenas um outro momento histórico durante o qual Portugal foi igualmente escrutinado pela imprensa estrangeira: o 25 de Abril e o PREC. «A grande diferença é que, enquanto os outros dois acontecimentos foram muito localizados no tempo, originando uma atenção internacional sobre Portugal que não se prolongou por mais de duas semanas, o período revolucionário português fez com que o nosso país fizesse manchetes e capas de revistas ao longo de mais de ano e meio». Uma janela temporal que obrigou a dupla a focar a sua investigação sobretudo em «matérias de opinião (editoriais, comentários, análises), deixando de lado as inúmeras notícias, reportagens e entrevistas que se publicaram. E fizemos ainda um levantamento de centenas de cartoons editoriais, que são também matéria de opinião, e cuja reprodução considero uma das riquezas deste livro». Estes cartoons, aliás, preenchem as páginas deste livro, dando conta de um olhar irónico sobre o que se passava em Portugal.
Nas Bocas do Mundo – O 25 de Abril e o PREC na Imprensa Internacional resulta da consulta de publicações como o Der Spiegel, O Globo, a Newsweek, o New York Times, a Time Magazine, o Corriere Della Serra, o Libération ou o The Guardian, provenientes de 20 países – entre os quais Alemanha, Argentina, Brasil, Espanha, EUA, França, Grã-Bretanha e Itália, que permitiram a Joaquim Vieira e Reto Monico retirar conclusões transversais aos países e órgãos analisados. De forma geral, e a tender para a «simplificação», eram três as preocupações que a imprensa estrangeira alimentava face aos acontecimentos em Portugal: «Numa primeira fase, compreender a natureza e os objectivos do 25 de Abril, que não se encaixava nos clichés golpistas dominantes; depois interrogar-se sobre se os militares se apegariam ao poder ou se o transfeririam voluntariamente para os civis e, por último, em que medida os comunistas e os militares revolucionários se apropriariam do poder».
Esta preocupação com o peso dos comunistas foi o que mais surpreendeu Joaquim Vieira, que descobriu na imprensa estrangeira um olhar preocupado com as forças associadas à extrema-esquerda. O mesmo olhar que acabou por transformar Portugal numa espécie de palco – e arma de arremesso – para o confronto entre ideologias políticas. «O confronto esquerda-direita estava muito presente no palco político de outros países europeus, como a Itália ou a França, e o caso português foi utilizado como arma de arremesso entre as diversas forças partidárias nesses países. Houve uma espécie de ‘nacionalização’ das querelas políticas portuguesas para serem aplicadas localmente, o que acabou por dar ainda maior projecção ao que se passava em Portugal».
Para os órgãos de comunicação social estrangeiros, Spínola, Costa Gomes, Vasco Gonçalves, Otelo Saraiva de Carvalho, Melo Antunes, Álvaro Cunhal e Mário Soares tornaram-se os heróis – e os anti-heróis – da revolução, e protagonistas do olhar curioso sobre um país que o mundo temia estar na iminência de uma guerra civil e da tal ameaça comunista. Mas, perante os receios, a imprensa estrangeira acabou por descobrir a serenidade dos portugueses, esse povo dos brandos costumes, num pequenino país à beira-mar plantado. Foram estas as características que passaram a ser enaltecidas na comunicação social. O 25 de Abril e o PREC acabaram por ser entendidos – e elogiados -, e o país passou a servir de exemplo. «Até ao 25 de Abril, Portugal era um país esquecido e ignorado, remetido a um canto da Península Ibérica, e que apenas era mencionado porque teimosamente mantinha uma quixotesca guerra colonial em África, cujo sentido ninguém percebia. O sobressalto político e cívico que o país viveu em 1974 e 1975, e a forma como, apesar de tudo, as coisas se resolveram pacificamente e se encaminharam para uma normalização democrática fizeram com que Portugal e os portugueses passassem a ser vistos do estrangeiro com um olhar muito mais positivo. Não éramos, afinal, o povo amorfo e resignado que parecíamos. A cobertura da imprensa estrangeira foi fundamental para alterar esse ponto de vista. Deixaríamos assim de estar ‘orgulhosamente sós’, como uma vez Salazar fizera questão de sublinhar».