Com a sua vasta experiência política como vê a situação da Síria?
Uma tragédia sem fim à vista a decorrer às portas da Europa e que mostra bem as insuficiências das políticas de boa vizinhança europeias. Esta guerra e crise prolongada põem também a nu a debilidade dos mecanismos internacionais de mediação de conflito e a inexistência de sistemas de detecção precoce de crises que permitissem intervir antes de as tensões degenerarem em conflitos armados.
O que o levou a eleger estudantes sírios e não, por exemplo, iraquianos, também vítimas de um conflito?
Tratava-se de desenvolver uma operação de emergência humanitária no plano da educação superior, ditada por uma circunstância excepcional de um país em guerra com um sistema de ensino paralisado e com milhões de cidadãos refugiados em países vizinhos, impossibilitados de prosseguir a sua formação universitária. Este programa, aliás, envolve também universidades iraquianas: temos algumas bolsas atribuídas a estudantes sírios em universidades no norte do Iraque.
Participou na selecção dos candidatos. Que casos o chocaram mais?
Acompanhei as últimas fases da selecção. Lembro-me do caso de duas candidatas, refugiadas num país do Golfo, fechadas em casa simplesmente por o visto de permanência nesse país lhes barrar o acesso ao ensino superior. Lembro-me também de um sírio-palestiniano que não queria acreditar quando lhe foi comunicado que tinha sido seleccionado, de tal forma isso lhe parecia bom demais para ser verdade. Recordo-me igualmente de uma rapariga que foi escolhida, mas a quem os pais não deixaram viajar e que, mais tarde, nos escreveu a dizer que os tinha finalmente convencido e que estava pronta a vir.
Qual foi a maior dificuldade que sentiu?
A de arrancar com um projecto a partir do zero e a necessidade de trabalhar a contra-relógio. Sendo um programa de emergência académica, a abordagem não podia ser a de um programa regular de bolsas de estudo – que pode demorar um ano, entre a apresentação da candidatura, a selecção, a admissão na universidade e a conclusão de todos procedimentos administrativos de acesso e permanência noutro país.
E o que o surpreendeu mais?
A enorme disponibilidade das pessoas para contribuir para a materialização do projecto apesar de todas as crises surpreendeu-me, bem como o enorme impacto deste projecto, afinal simples, não só para os beneficiários directos, mas também no plano das famílias, dos amigos e conhecidos e a forma como contribui para fazer renascer a esperança num futuro melhor.
Até quando será possível manter estes apoios?
O projecto inscreve-se na necessidade de criar saídas de emergência no plano da educação superior para estes jovens que, por causa da guerra, tiveram de interromper os estudos. Por isso, sendo um programa de emergência humanitária, deixa de fazer sentido quando a paz for restaurada e o sistema de ensino restabelecido na Síria. Em segundo lugar, o objectivo é que os estudantes completem a sua formação universitária. Em terceiro lugar, a sua prossecução depende também da continuidade das parcerias e dos fundos angariados.