Na fábrica de Luís Rato, no Cartaxo, estão mais de 100 projectos de street food à espera de serem concluídos. Ainda há dois meses, fecharam negócio com uma centena de veículos (para uma importante marca de gelados) que vão circular em Portugal e Espanha, já para não falar das roulottes de salsichas que chegarão ao Brasil nos próximos meses e na série de emails diários que o empresário recebe com propostas de novos clientes. “O street food hoje é uma moda e estou convencido de que as marcas a vão aproveitar para relançar conceitos de negócios que estavam perdidos.Tem uma vantagem face à conjuntura actual: antigamente as pessoas iam para os centros comerciais porque tinham um cartão de crédito e tinham reacções emotivas quando compravam. Hoje, como não temos dinheiro, vamos novamente para a rua e na rua o que funciona são negócios de pocket money. As pessoas vão passando e consumindo”, resume Luís Rato, que acredita que a sua fábrica Kiosque Street Food vai atingir este ano um valor de negócio de cerca de 650 mil euros.
Para o incremento desta tendência, o empresário apresenta como explicação primeira a crise económica: “As pessoas levam a comida para os seus locais de trabalho porque os salários em Portugal estão a diminuir. E o street food vem colmatar isto porque as pessoas passam a estar na rua a conversar, a divertir-se e a comer uma refeição barata. Há muitas oportunidades que vão nascer do negócio de rua”.
Mas há mais. “O custo de implantação de um negócio destes é muito inferior a um negócio normal porque eu vou atrás dos clientes, não são eles que vêm ter comigo!”, brinca. E pergunta: “Se formos à praia não estamos a comer street food, quando a senhora das bolas de Berlim ou dos gelados vem ter connosco? Isto já é comida de rua, aliás o street food começou aí! Foi aí que começámos a comer na rua, com a bolacha americana, com a bola de Berlim e com os gelados, mas esquecemo-nos disso…”, remata.
Da rua para os restaurantes e dos restaurantes novamente para a rua. Dos muitos negócios que estão agora a circular pela cidade de Lisboa, muitos começaram com um ponto fixo. Exemplo disso é o Bananacafé, com um quiosque na avenida da Liberdade, a Hamburgueria, com um espaço fixo no jardim da Parada, em Campo de Ourique, o Hot Dog Lovers, com um pequeno restaurante na Avenida Álvares Cabral, ou o Wasabi que teve como primeira sede (e que mantém), o largo do Martim Moniz.
Até o restaurante Sea Me no Chiado assumiu a sua vertente de rua com a nova carrinha Frigideira de Bairro. Todos estes projectos integram a iniciativa camarária intitulada 'Lisboa Sobre Rodas', que teve início no passado mês de Março e que se vai estender ao longo dos próximos dois anos.
O projecto começou a ser traçado pelo vereador Sá Fernandes: “Várias pessoas vieram ter connosco à Câmara para pedir uma licença para vender na rua. Nós decidimos juntar esses cinco candidatos no mesmo projecto e a ideia foi circularem ao longo da semana por pontos fixos da cidade e ao fim-de-semana – sexta, sábado e domingo – juntarem-se no Alto do Parque Eduardo VII. Acho que conseguimos juntar as cinco vontades e que o projecto vai ser um sucesso”, admite o vereador.
Francisco Vasconcelos, da Hamburgueria, adianta ainda: “Cada um de nós tem um produto que complementa o do outro, além de que funcionamos como se fosse uma linha de eléctrico: Parque Eduardo VII, Entrecampos, Saldanha, Amoreiras e Cais do Sodré. Todas as semanas fazemos este percurso. Temos uma cidade tão bonita, com 200 e tal dias de sol por ano, com tantos espaços ao ar livre para aproveitar, e ainda por cima agora posso ir ao mesmo sítio e comer sempre uma coisa diferente. Acho que não há melhor do que isto!”, garante.
Ainda assim, as licenças não são fáceis de arranjar. A Yonest (iogurtes caseiros) e a Chippers (batatas fritas belgas) que foram para a rua muito antes de o projecto camarário ganhar forma, enfrentaram as dificuldades inerentes a montar um negócio novo na cidade. “Foi muito difícil conseguirmos a licença. Quem está neste meio sabe que criar alguma coisa que seja diferente é muito difícil, porque ninguém sabe como fazer as coisas e às vezes é necessário criar relações. Não estou a falar de cunhas, mas de saber quem são as pessoas certas, perceber quem é que pode mover as coisas…”, lembra Miguel Santana, um dos responsáveis pela Chippers. Já a Yonest começou como uma pequena start up, depois de ter recebido 100 mil euros do QREN (Quadro de Referência Estratégico) para dar forma ao negócio.
E só há pouco menos de um ano começou a dar os seus primeiros passos na rua, mesmo com o apoio da comunidade de Empresas Start Up Lisboa. Daí que não seja de estranhar que muitos destes jovens empresários (a média de idades não ultrapassa os 30 anos), mantenha os seus empregos a full time fora do negócio de rua. Vicente Silva e Pedro Paiva, do Wasabi, trabalham a tempo inteiro numa operadora telefónica e Francisco Vasconcelos, da Hamburgueria, mantém o emprego na eléctrica nacional. Seja como for, assume-se como empreendedor: “Tenho a mente aberta para tudo o que achar que dá, que é giro, que tem funcionalidade e que traz valor à cidade”.