Formou-se na Commedie Française, uma companhia de teatro fundada em 1680 e ligada à figura de Molière. Que caminho percorreu até lá?
Desde os meus 11 anos que fazia improvisações na escola. E tentava ser cada vez mais preciso e convincente. No liceu encontrei uma agente que me sugeriu trabalhar com ela. Na altura já sonhava com o cinema. Quanto à Commedie Française, nunca pensei que fosse possível chegar lá. Quando fui convidado, achei que era uma piada. E no teste final nem dormi. Foi quase como quando soube que ia fazer este filme…
… em que dá vida a Yves Saint Laurent. O que levava em mente quando começou a rodagem?
Tínhamos bem claro que queríamos fazer uma história de amor e criação. Sinto-me com muita sorte por, aos 24 anos, receber esta proposta para um papel tão intenso. Tive cinco meses de preparação, ao longo dos quais conheci pessoas incríveis como o Pierre Bergé, o companheiro de Yves Saint Laurent. Depois deste tipo de preparação sabemos muito melhor o que podemos fazer.
Pierre Bergé é um nome que tem mesmo de estar ao lado de Yves Saint Laurent…
O Pierre passou mais de 50 anos com Yves Saint Laurent e falou-me sobre como ele era em privado. Tem histórias incríveis. YSL era um tipo cómico, embora com o seu lado melodramático, algo depressivo, destrutivo mesmo, e até egoísta.
Que aspecto desta figura mais o fascinou?
Ele era um tipo muito intenso e complexo. Em todo caso, acho que me fascinou mais o seu lado frágil e o facto de ser uma pessoa sempre desesperada. Felizmente, conseguia transformar esta violência em algo criativo. Foi isso que o ajudou a ser quem era.
Como é que um actor de comédia encara a perspectiva de interpretar uma personagem real e com estas nevroses?
Isso faz parte do desafio de ser actor: podermos entrar na pele de alguém, mesmo quando isso parece estar fora da nossa linha de trabalho. E deu-me a oportunidade de mostrar que posso fazer mais do que interpretar personagens de estudantes.
Além de que teve de interpretar a mesma pessoa desde os 21 anos até à velhice…
Sim, esse foi o maior desafio. Mas fui recebendo alguns conselhos, sobretudo do realizador. Conversámos muito sobre a maquilhagem a usar na parte final do filme. E só para isso tinha de esperar quase quatro horas. A ideia não era que eu desaparecesse por detrás da máscara, era abstrair da personagem para dar uma maior ênfase à dor dele provocada pela doença na fase final da vida.
Contracena com Ruben Alves, o realizador português, que participa neste filme como actor, não é verdade?
O Ruben é um grande amigo meu. E não o digo apenas por termos feito este filme juntos. Acho que pertencemos à mesma família cinematográfica. Enquanto ele estava a fazer A Gaiola Dourada, eu participava numa série francesa, e o produtor da Gaiola e da minha série era o mesmo. Por isso, está a ver, temos andado sempre juntos. Mas para lhe responder, adorei a experiência de trabalhar com o Ruben.
Antes disso já tinha tido contacto com outros portugueses?
Quando andava no liceu sempre tive amigos portugueses. Aliás, eu próprio tive ocasião de ir a Portugal algumas vezes. É um país lindo! Adoro o Ruben e acho que é também por causa dele que as pessoas gostam tanto do filme. Estou muito feliz por ele.
Sabe se o Karl Lagerfeld, uma das figuras que aparecem retratadas, viu o filme?
Sim, viu o filme. E disse que o Nikolai Kinski a interpretá-lo era… 'aceitável'! O que para ele é muito mais do que aceitável. Ou seja, adorou! Acho que até chorou durante a projecção.
Como vê a obra de YSL enquanto estilista?
Quando interpretamos um criador desta dimensão temos de aprender a gostar de tudo o que ele fez, se não torna-se mais difícil interiorizar a personagem. Felizmente, neste caso essa tarefa estava facilitada. Sabia que os vestidos que vemos no filme são originais? E que vieram de museus de propósito para o filme? A colecção Mondrian é a minha favorita. Gosto muito da ideia, das cores. É simples e ao mesmo tempo tem um enorme impacto visual.
Liga muito ao universo da moda?
Antes do filme, confesso que não ligava. Tinha apenas uma vaga noção do que é a elegância. Agora interesso-me mais, sobretudo por aqueles que fizeram a história da moda, como Balenciaga, Chanel… Sinto que existe uma aura de mistério em redor deles.
Teve alguma preparação especial para este filme?
Tive ocasião de visitar com o realizador alguns bastidores de passerelles para perceber como as modelos se movem, o que vive o criador, como é o nervosismo. Claro que não sou um 'fashionista', mas sou capaz de admirar o trabalho que está por detrás de uma colecção.
Este filme conta uma história de amor. Para si, foi diferente pelo facto de se tratar de um romance entre dois homens?
Digamos que o lado da homossexualidade era secundário. Poderia ser um homem ou uma mulher, pouco importava. O filme mostra como vivia este casal. Mas nunca de uma forma política. O Pierre Bergé costumava dizer: 'Sim, sou gay, mas isso é como ser canhoto. Não temos de falar sobre isso horas a fio'. Claro que não podemos ignorar que foi um dos primeiros casais a assumir a homossexualidade. E em frente aos media. Mas gosto da forma como o fizeram. Acho que foi muito elegante.