O autor avisa, logo de início, que só vai tratar de uma versão do conservadorismo – o anglo-saxónico –, e toma como referência a obra e a linhagem de Edmund Burke, autor das Reflexions on the Revolution in France. É a partir de Burke e dos seus continuadores que JPC identifica uma ‘ideologia conservadora’. Esta ideologia conservadora parte de uma antropologia da ‘imperfeição humana’ e apoia-se na «importância da realidade» como medida e filtro da avaliação dos fundamentos da sua mundivisão (prefiro ‘mundivisão’ a ‘ideologia’, pois, para os conservadores, ‘ideologia’ é sempre uma síntese menor que a vida e implica um programa de acção).
JPC cuida de sublinhar a distinção entre o conservador e outros tipos e arquétipos políticos, como os revolucionários – sejam eles ‘de esquerda’ (as várias famílias socialistas e marxistas) ou ‘de direita’ (os fascistas). Enquanto o revolucionário luta pela propagação e instauração de modelos de perfeição sócio-política e aspira a uma transformação do homem pela transformação da sociedade, para o conservador é o ‘teste do tempo’ que determina a forma da sociedade, que é importante demais para ser mudada pela razão.
Na sua aceitação da ordem natural das coisas – e dos homens, imperfeitos e livres –, o conservadorismo rejeita a revolução, mas tão pouco se confunde com a reacção, que vive uma utopia passadista e quer o regresso a uma ordem ideal pré-revolucionária.
O conservadorismo de que JPC não trata, o continental, tem características muito diferentes do anglo-saxónico, explicáveis pela Geografia e pela História. Os ingleses cortaram a cabeça ao rei Carlos I século e meio antes dos franceses a cortarem a Luís XVI. Depois da Glorious Revolution de 1688, a Grã-Bretanha tornou-se uma monarquia constitucional, mas o verdadeiro poder político passou a pertencer a uma oligarquia aristocrática de base rural mas com interesses no grande comércio.
Estes interesses adaptavam-se perfeitamente à doutrina conservadora e a exploração do Império permitia às elites locais serem liberais na Ilha, protegida pela Royal Navy. Com uma capacidade de projecção do poder e uma diplomacia realista no Continente, não precisaram, como as monarquias continentais, do Estado autoritário e militarizado. Por isso, o seu conservadorismo foi liberal.
Já o conservadorismo francês, com Maurras e a Action Française, foi nacionalista e autoritário e inspirou outros autoritarismos latinos – dos Integralistas a Salazar, da Acción Española às correntes sul-americanas. E há ainda as ricas tradições conservadoras alemã e russa, do século XIX.
O conservador usa o poder político para manter a sociedade como ela é, enquanto o progressista – o revolucionário e o reformista – usa o poder político para a mudar. É mais ou menos isto, mas o livro de JPC ajuda a percebê-lo melhor.