"O risco de contágio [na Europa] é pequeno. Pode haver casos importados — aliás, já houve no passado, salvo erro, três: na Holanda, na Inglaterra e na Rússia — e agora, já neste surto, houve um nos Estados Unidos, mas são casos completamente esporádicos", defendeu Jaime Mina em declarações à Lusa.
O especialista em doenças tropicais do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) considera que, além disso, "há capacidade dos países envolvidos de isolarem estes doentes e de os tratar em isolamento".
Mesmo para a vizinha Guiné-Bissau, que faz fronteira com o noroeste da Guiné-Conacri, Jaime Mina explicou que o risco é baixo, porque a área onde se regista o surto "é na fronteira onde se juntam os três países: a Libéria, a Serra Leoa e a Guiné-Conacri", ou seja, "é no sudeste, na outra ponta [do país]".
"E a Guiné-Conacri pode parecer pequenina quando comparada com Angola ou outros países gigantes, mas tem três vezes a área de Portugal, portanto, o surto está a umas centenas de quilómetros da fronteira [com a Guiné-Bissau], sublinhou.
Embora confirmando que a situação nos três países infectados "está descontrolada" – como indicou a organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras -, por se tratar de países pobres, com poucos ou nenhuns recursos, o especialista acredita que a situação será resolvida em breve.
"Eu diria que a situação está descontrolada, não por causa do vírus, mas por causa da situação de cada um dos países: os Médicos Sem Fronteiras têm uma fotografia, que eu acho que vale mais que mil palavras, duma ambulância com um letreiro a dizer, em letras garrafais, 'proibidas as armas' e depois, por baixo, 'não disparem, nós somos da Saúde'. Aquilo são zonas de guerra", observou.
"E fazer saúde pública em zonas onde há guerrilheiros e em zonas do país — quer da Libéria, quer da Serra Leoa — em que o Governo não tem autoridade é muito, muito difícil", sustentou.
Além disso, o surto começou numa região de floresta densa da Libéria, "com a agravante de que existem minas de diamantes por lá", apontou Jaime Mina, acrescentando que "seria difícil encontrar uma zona do mundo onde fosse mais difícil combater um surto de uma doença infecciosa".
O virologista chamou a atenção para o facto de a Organização Mundial de Saúde (OMS) ter recentemente convocado responsáveis dos três países afectados e também dos países vizinhos, instando-os a participar numa campanha para deter o vírus do Ébola, que se transmite por contacto directo com o sangue, fluidos biológicos ou tecidos de pessoas ou animais infectados.
"A OMS fez uma aposta, há cerca de dez dias, e tem uma probabilidade de sucesso: fez uma reunião com as entidades políticas — e a solução passa obrigatoriamente pela vontade política regional -, não apenas dos três países, porque aí arriscava-se a acabar em tiroteio, mas dos países à roda, incluindo países já com um mínimo de estruturas, como o Senegal, a Costa de Marfim, ou mesmo a Nigéria, que também foi convidada e esteve presente", relatou.
E nessa reunião, "embora de uma forma muito subtil, foi dito e ficou escrito que, se os países afectados não tivessem capacidade de colaborar numa acção transfronteira para controlar o surto, os países vizinhos seriam convidados a assumir a responsabilidade", prosseguiu.
"Todos os países são muito ciosos da sua independência e a última coisa que querem, ainda por cima com o gigante que é a Nigéria, é que o Governo nigeriano mande para lá umas dezenas de milhares de pessoas e tome conta do assunto", argumentou.
Após um período de incubação do vírus que dura entre uma semana e dez dias, e em que a doença não é contagiosa, esta manifesta-se através de febre, hemorragias, vómitos e diarreias, variando a taxa de mortalidade entre os 25 e os 90 por cento. Não é conhecida vacina contra a doença.
O surto surgido no início do ano foi declarado primeiro na Guiné-Conacri, antes de se estender à Libéria e depois à Serra Leoa, países que, a 23 de Julho, totalizavam 1.201 casos e 672 mortes, segundo o último balanço da OMS.
Lusa/SOL