Em comunicado, a Procuradoria-Geral da República informa que não foi possível reunir indícios suficientes para acusar os titulares de cargos políticos responsáveis pelos orçamentos regionais no período entre 2003 e 2010. Estavam em causa possíveis crimes de prevaricação, violação das regras de execução orçamental e falsificação – mas o DCIAP concluiu “não estarem preenchidos todos os requisitos” desses crimes, necessários para deduzir uma acusação.
No que respeita ao crime de violação das regras de execução orçamental, “as situações detectadas terão ocorrido não na fase de execução, mas no momento da elaboração das normas orçamentais, sendo que a incriminação desta factualidade foi afastada pelo legislador” na lei dos crimes praticados por titulares de cargos políticos. Quanto ao crime de falsificação, “ainda que se tenham considerado verificados os requisitos objectivos do crime, entendeu-se não se mostrar provado o dolo específico, ou seja, não se provou que os arguidos tivessem agido com o propósito de causarem prejuízo a quem quer que fosse”, diz a PGR.
No inquérito, iniciado em Setembro de 2011, chegaram a ser “constituídos e interrogados cinco arguidos, entre os quais um secretário regional em exercício de funções e um ex-secretário Regional”, revela a PGR, mas sem identificá-los. O DCIAP reuniu “vasta documentação”, incluindo os relatórios de auditorias e pareceres anuais do Tribunal de Contas (TdC) dos oito anos em causa, realizou buscas na Secretaria Regional do Equipamento Social, “onde se recolheu grande quantidade de documentos, correspondência e informações”, e interrogou 50 testemunhas.
O que estava em causa na ‘Operação Cuba livre’
Recorde-se que a investigação agitou a Madeira em Abril de 2012. Na altura, em vez da PJ ou da PSP, a GNR foi a entidade escolhida pelo DCIAP para acompanhar as operações de buscas no terreno, numa operação que foi baptizada de ‘Cuba Livre’.
Uma auditoria feita pelo TdC havia encontrado 1.878 facturas que estariam “escondidas”, relativas a obras que foram executadas entre 2003 e 2010, ou seja, em anos anteriores àqueles em que foram lançadas, na contabilidade da região.
O relatório do TdC concluíra que essa dívida oculta resultara de um acto consciente, praticado por cinco membros do governo regional: Santos Costa, antigo secretário do equipamento social, o seu chefe de gabinete, Ricardo Reis, o secretário do plano e finanças, Ventura Garcês, a directora do gabinete de controlo e gestão orçamental e ainda o director regional de orçamento e contabilidade.
As concessões rodoviárias e outras obras públicas atribuídas sem cabimento orçamental estiveram na mira da investigação. A delegação do DCIAP que então visitou a Madeira, incluindo peritos em informática, esteve a analisar documentos (que seguiram por avião militar para Lisboa) relacionados com as concessões rodoviárias, incluindo a Viamadeira, responsável, com a empresa pública de saúde (SESARAM), por um ‘buraco’ de 568 milhões, detectado pelo Eurostat e pela troika nas contas da Região, e com grande impacto no défice nacional.
Face ao reconhecimento de uma dívida superior a 6,3 mil milhões de euros, a Região viu-se na contingência de assinar com o Governo da República, a 27 de Janeiro de 2012, uma programa de resgate financeiro, que se prolongará até Outubro de 2015.
Em Setembro de 2011, a dívida pública da Madeira, incluindo empresas públicas e autarquias, era de 6.328 milhões de euros, um valor 465 milhões de euros superior ao anunciado pelo Governo regional. A dívida da Madeira representava 123% do PIB do arquipélago e 927% da sua receita fiscal anual. Quase metade da dívida (47%) era relativa às empresas públicas regionais.
Nas reacções à investigação, Alberto João Jardim disse que não se arrepende de ter aumentado a dívida da Madeira, justificando que, quando assumiu a liderança do Governo, em 1978, foi para mudar a região.
Ainda assim, extinguiu o departamento governativo que mais contribuiu para a alegada dívida oculta (a Secretaria do Equipamento Social) e afastou do governo o seu secretário, Santos Costa.