À Tabu, o criador falou sobre o novo projecto, mas também recuou no tempo e contou como em criança, muito antes de existirem videojogos, se distraía a atirar pedras. Revelou ainda em primeira mão novidades sobre a nova consola 3DS, acabadinha de sair no Japão, mas que não chegará à Europa antes de 2015.
O Sr. Miyamoto é conhecido por fazer videojogos, mas desta vez estamos aqui porque fez um filme – as curtas-metragens ‘Pikmin Shorts’. Há uma grande diferença entre fazer filmes e fazer jogos?
Eu sabia que eram meios diferentes, mas agora que fiz o filme é que percebi como pode ser uma experiência tão fascinante. Quando pensamos num jogo, temos de ter presente a ideia da interactividade, ao passo que num filme, para extrair emoções do espectador, temos de lhe dar essa informação. Mas talvez fazer um filme deste tipo não seja assim tão diferente de fazer uma animação para os jogos. Ambos são processos morosos e que requerem tenacidade, pois temos de tomar muitas decisões e, por vezes, alteramo-las vezes sem conta.
Já admitiu que aprecia muito o trabalho de Hyao Miyazaki. Gostava de trabalhar em parceria com ele?
Respeito muito o trabalho de Miyazaki-san e Totoro [O Meu Vizinho Totoro, 1988] é o meu filme de animação favorito. Encontrei-me com eles bastantes vezes, mas ele odeia videojogos [risos]. Ambos percebemos bem a diferença entre os jogos e os filmes: os jogos são interactivos e os filmes vivem da narrativa. Mesmo que quisesse colaborar com ele, acho que não iria funcionar, simplesmente por ele odiar videojogos…
Costuma ir ao cinema? De que tipo de filmes gosta mais?
Além do Sr. Miyazaki, que já referi, posso também dizer que aprecio muito o trabalho de Spielberg, em particular as aventuras de Indiana Jones. São filmes repletos de ideias novas.
Gostaria de poder um dia trabalhar com Spielberg?
Nunca se sabe… Acho que seria óptimo poder combinar as ideias de várias pessoas para criar algo verdadeiramente único. Eu gostaria de poder fazer isso com jogos. Por acaso nunca cheguei a perguntar a Spielberg como integrou todas aquelas ideias nos seus filmes.
Li recentemente que uma vez chegou a ter mais de 30 ideias enquanto lavava a loiça.
Sim, corre um rumor de que tenho muitas ideias… Seja como for, não sou só eu. Tento rodear-me de colaboradores que sejam igualmente muito criativos.
Falemos então da concretização dessas ideias. Como é o processo até darem origem a um videojogo?
Normalmente executo essas ideias dentro de um modelo físico, uma espécie de caixa. Entretanto, doto essa figura de movimentos. Se o resultado for interessante, poderá ajudar-nos a desenvolver uma personagem.
Lembra-se de como criou o Super Mario?
Não o defini como se fosse uma personagem. Acabou por ser o resultado de uma evolução. Por exemplo, se encontraria inimigos em que não poderia tocar e de que forma o jogador poderia compreender as suas características por forma a desviar-se deles. Já os Pikmin são um pouco diferentes, pois partimos com a criação de centenas de Pikmin. Aí pedi aos designers ideias para desenvolvermos um guião em que vários Pikmin teriam funções e atributos diferentes.
Já agora não esqueçamos o nascimento de Zelda, a princesa do reino imaginário de Hyrule…
No caso de Zelda criámos uma personagem aventureira com cerca de doze anos. E tal como Mario, queríamos que fosse fácil de compreender. O Mario, por exemplo, tem um nariz grande, ao passo que o Link [guerreiro cuja missão é salvar o reino e a princesa] tem orelhas grandes. Como nos fez lembrar um duende demos-lhe um escudo para se proteger. E por que é ele canhoto? Na verdade acabou por ser um erro do designer que fez o braço. Mas como eu também sou canhoto, acabou por ficar assim.
Como olha para o enorme crescimento dos jogos para smartphones? Acha que já se tornou um território apelativo para a Nintendo?
Na Nintendo temos um hardware e um interface que são únicos. É algo desenhado para ser apreciado numa sala. Antes de me poder aventurar nesse território tão bem aproveitado pelo iPhone, gostaria de desenvolver novas ideias. Talvez possamos vir a encarar o smartphone como fazendo parte do jogo, mas não nos interessa muito desenvolver produtos novos para smartphones.
Considera o smartphone uma ferramenta demasiado individualista?
A nós interessa-nos criar um jogo em que todos os que estão numa sala se possam interessar. O que não significa que os smartphones sejam necessariamente negativos, mas é importante que as crianças saibam brincar na rua, ler livros e estudar.
O universo dos videojogos costuma ser referido sempre que existe algum incidente violento…
Isso só pode acontecer por essas pessoas estarem demasiado envolvidas e sem contacto com os outros. É esse o problema. Agora, acho injusto colocar a culpa apenas nos videojogos. A sociedade e os pais, em primeiro lugar, têm a função de proporcionar aos filhos um conjunto de experiências diferentes.
O que nos pode adiantar sobre o novo modelo da consola Nintendo 3DS, que acaba de sair no Japão?
A grande diferença tem a ver com o 3D, que se mantém constante no ecrã, não sendo necessário ajustar a consola para ver na perfeição. Na atual versão, o 3D nem sempre funciona, por isso muitos acabam por desliga-lo. Na nova pode ver-se o 3D de qualquer ângulo, o que fantástico para os jogos de acção. Por outro lado, a caneta que era opcional já está incluída. Tal como o leitor de NFC (near filed communication – comunicação por campo de proximidade) já está também incluído. Por isso podemos usar a personagem Amiibo e interagir com ela.
Quando chegará à Europa a nova 3DS?
Ainda não anunciámos o lançamento na Europa, mas nunca será antes de 2015.
Irá alguma vez fazer um filme sobre a Zelda, como tem vindo a ser insistentemente desejado pela comunidade de gamers?
Um filme Zelda? O que lhe posso dizer é que estamos concentrados em desenvolver o novo jogo da Zelda, que será bastante atraente. A personagem de Link corre num campo aberto. Mais não posso dizer…
O universo dos videojogos tem-se desenvolvido de uma forma incrível. Que tipo de conselhos daria aos novos game designers?
Quando era jovem queria ser designer de manga. Mas sempre me disseram que não deveria imitar os outros, mas tentar criar as minhas próprias histórias. Isso aplica-se a quem quer ser criador de jogos. Todos gostam muito de jogar e pretendem fazer jogos semelhantes aos que mais admiram. Quem deseja ser profissional tem de ter ideias originais. Portanto, talvez mais do que jogar, sugeria que tivessem experiências diferentes fora do universo dos jogos. E também que procurem especializar-se numa qualidade particular, seja programação, música, artes gráficas. Depois, se lhes sobrar tempo, então poderão jogar.
Ainda joga ao Super Mario?
Antes de os jogos estarem finalizados jogo sempre bastante. Não do início ao final, mas sim níveis diferentes. Confesso que fora disso não tenho muito tempo.
De que tipo de jogos e brincadeiras mais gostava quando era ainda criança, digamos com oito ou treze anos, que são as idades de muitos dos seus clientes? Sendo certo que não existiam videojogos, claro.
Não existia aquilo a que chamamos hoje jogos, é verdade. Nessa altura, com os meus oito anos, brincava a atirar pedras. Entretanto apaixonei-me pelo universo manga. Só que acabei por desistir de ser um artista visual e dediquei-me à criação de design electrónico. E foi precisamente nessa altura que começaram a surgir os videojogos. Por isso, fazer videojogos acabou por ser uma questão de oportunidade.