Em S. Bento desde 2005 e sem oposição à altura, Sócrates era o senhor-todo-poderoso da política portuguesa. E Ricardo Salgado sedimentava, com a ascensão do BES, a sua fama de ‘DDT’ (Dono Disto Tudo). Visto agora a esta distância, Portugal parecia outro país.
E, acrescente-se, esse era um país mais sujeito a redes de influência ilegítimas, mais vulnerável ao tráfico de favores para determinadas clientelas, mais dominado por pequenos ou grandes poderes não escrutinados. Era um país com menor transparência democrática. um país pouco respirável.
Basta recordar que o dueto Governo/BES +PT, essa aliança dos poderes político e financeiro, tentou controlar a liberdade de imprensa e a comunicação social, asfixiando economicamente jornais como o SOL enquanto dava crédito ilimitado a outros grupos mediáticos, silenciando vozes incómodas da TVI e procurando comprá-la. Tentou colocar a banca, em particular o BCP e a CGD, ao serviço das conveniências político-partidárias, com a conivência do BES. E não hesitou em levar o país à beira da bancarrota para prosseguir os seus intentos para lá de todos os limites. O país pagou bem caro esses anos de dueto Sócrates/Salgado.
Só nas democracias e nos Estados de Direito a separação de poderes permite que o poder judicial funcione como travão aos abusos dos detentores de outros poderes – políticos, financeiros ou económicos. Nenhum outro regime salvaguarda, como as democracias, a prevalência da lei. Portugal teve agora essa demonstração. Felizmente, é um país diferente – e melhor – do que era há cinco anos.
José Sócrates manifestou, há quatro meses, a sua solidariedade com Ricardo Salgado quando este foi detido para interrogatório judicial. Será curioso ver se Salgado retribui agora publicamente esse gesto.