Acabou por se dedicar à advocacia e no final ano passado criou uma sociedade com o melhor amigo – a Raposo Magalhães, Trindade Ferreira & Associados. Para lá encaminhou alguns dos clientes que tinha angariado sozinho nos últimos anos, como Carlos Santos Silva, o agora suspeito testa-de- ferro de José Sócrates.
Foi Gonçalo quem tratou da venda das três casas da mãe do ex-primeiro-ministro a Santos Silva e a partir de 2011 o nome do advogado passa a constar como sócio ou gerente de sociedades onde circulam pessoas ligadas a Santos Silva. É o caso da Activadviser (consultoria de engenharia e arquitectura), a Belmontagro (exploração agrícola) e a Lulilartod (construção civil) – nesta última era sócio de Rui Manuel Mão de Ferro, economista e administrador da Codecity, empresa que tem a maioria do capital da SAD do Clube de Futebol os Belenenses, liderada por Rui Pedro Soares.
A entrada de Trindade Ferreira nesta teia de negócios surpreendeu os amigos. “Não se enquadra no perfil que conhecia”, diz um colega da sua juventude. Estudou no Liceu Francês, passou pelo Colégio São João de Brito e foi parar à Universidade Católica de Lisboa, onde começou a estudar Direito, tendo “demorado anos a licenciar-se”, conta quem o conhece. Pelo meio foi forcado no grupo Aposento da Chamusca e saía frequentemente à noite com amigos. Há cinco anos teve uma filha e há poucos meses foi pai de um rapaz.
Já ele é filho único, o pai é ginecologista e a mãe ex-técnica superior na secretaria de Estado da Cultura, tendo passado a infância na Quinta da Luz, em Carnide. Na freguesia vizinha, a de Benfica, vivia nessa época João Perna, outro dos quatro arguidos do mais mediático caso do país.
Irmã será ligação a Sócrates
João Perna foi criado no bairro social da Boavista, de onde saiu depois para a zona de Algueirão, em Mem-Martins. Aqui viveu com a mulher e os dois filhos, um de uma relação já anterior. Teve um pequeno negócio com o nome João Perna – Comércio de Marroquinaria Unipessoal, Lda que se dedicava ao retalho de peças e acessórios para veículos.
A empresa tinha sede no apartamento onde residia no 3.º andar esquerdo de um prédio na Praceta Raul Proença, em Algueirão. Mas também já aqui não mora, tendo mudado, tudo indica, para a Margem Sul do Tejo.
Passou os últimos anos, desde 2011, a transportar José Sócrates, ultimamente num Mercedes prateado.
A sua ligação ao ex-primeiro-ministro terá surgido através da irmã mais velha, Paula Cristina, uma funcionária do departamento de Relações Públicas da sede do Partido Socialista do Largo do Rato. “Faz parte da mobília da sede do partido”, diz um deputado socialista, recordando que Paula tem uma longa e fiel ligação ao partido. Nos últimos anos disponibilizou-se para dar o nome e ocupar o último lugar na lista de candidatos suplentes do PS às eleições para o Parlamento Europeu, em 2009. E antes de ir para a sede no Rato foi secretária pessoal de Rui Cunha, quando este ocupou o cargo de Secretário de Estado Adjunto do ministro do Trabalho e da Solidariedade entre 1999 e 2001, mantendo as mesmas funções quando o governante passou, em 2002, para a pasta dos Transportes.
O seu irmão João Pedro Soares Antunes Perna foi o primeiro dos quatro arguidos da operação 'Marquês' a ser detido: eram 21h38 do passado dia 20 quando foi levado pela polícia por suspeitas de fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais e detenção de arma proibida.
Já Gonçalo – o único que está a aguardar julgamento em liberdade, sendo acusado de fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais – foi detido quase cinco horas depois, às 02h15. Pouco tempo antes, às 01h45, o mesmo tinha sucedido ao seu cliente, Carlos Santos Silva, o homem que o Ministério Público diz que ser o testa-de-ferro de José Sócrates. Tem 53 anos e há 30 que é amigo do ex-líder do PS, quatro anos mais velho.
Cresceram juntos na Covilhã, são os dois engenheiros e nos últimos anos as suas vidas têm-se cruzado constantemente. Foi ele quem comprou as casas da mãe de Sócrates e durante os Governos do amigo viu o seu império empresarial prosperar. O grupo Lena, do qual foi administrador entre 2008 e 2009, e a Proengel, empresa que dirigia, conseguiram vários contratos com o Estado no tempo em que Sócrates comandou o país: só entre 2009 e 2011, a Proengel ganhou 43 contratos com o sector público. Os nomes dos dois surgem também em vários processos como o da Cova da Beira, que os terá aproximado, e no Face Oculta. Agora estãoambos presos, em celas a 136.6 quilómetros de distância.