No espaço de um ano, adiantou ao SOL o oficial da GNR responsável pela investigação, António e Manuel Pires furtaram, em vários pontos do país, pelo menos dez carrinhas pick-up, que lhes terão rendido cerca de 100 mil euros. Ao todo, os arguidos estão indiciados por 22 crimes, entre furto e viciação de viaturas e falsificação de documentos.
Transportadas por ferry para Marrocos
Aperfeiçoado ao longo dos anos, o método de actuação era singular: «Primeiro tentavam arranjar documentos de carrinhas deste modelo e normalmente conseguiam furtá-los pelo método carteirista. Depois, na posse desses documentos verdadeiros, procuravam viaturas que se encaixassem nas características (cor, marca e modelo) descritas nos documentos», explica ao SOL o oficial, sublinhando que «só em último recurso» é que os arguidos falsificavam documentos.
O passo seguinte era simples: «Falsificavam a matrícula, colocando outra chapa que coincidisse com a dos documentos, e também a do número de identificação de veículo (chassis)».
O esquema terminava com a exportação das carrinhas para Marrocos, Mauritânia e Guiné-Bissau. Era nesta fase que entravam em cena duas cúmplices (uma delas ex-mulher do irmão mais velho, António Pires), que ficavam à retaguarda: a sua função era conduzir as carrinhas até ao porto de Algeciras, no sul de Espanha, onde seguiam depois por ferry boat para os destinos finais. «Dificilmente eles arriscariam conduzir. Sabiam que, com o historial que tinham, se fossem abordados, levantariam logo suspeitas», refere o investigador.
A verdade é que os investigadores já estavam no encalço dos dois irmãos há cerca de um ano, através de vigilâncias e escutas telefónicas. Em Maio deste ano, durante uma operação articulada com os congéneres espanhóis, os militares da GNR conseguiram apreender duas pick up momentos antes de serem despachadas para África – e esta será uma das provas fundamentais do processo.
Principal arguido tem seis condenações anteriores
No passado dia 14, a investigação precipita-se quando o cabecilha do grupo, que mora em Marinhais (Salvaterra de Magos), foi detido em flagrante delito a tentar furtar mais uma carrinha todo-o-terreno, na zona da Chamusca.
'Toni', como é conhecido, voltou, pela quinta vez, à prisão (ficou em preventiva). Tem no cadastro seis condenações que revelam traquejo em várias áreas: burla, falsificação de documentos (passaportes cartas de condução, entre outros), furtos e tráfico de veículos, assaltos à mão armada, posse de armas proibidas, engenhos e substâncias explosivas.
Foi em 1987 que António Manuel Pires esteve preso pela primeira vez, na cadeia de Setúbal. «Empregado de balcão» foi a profissão que indicou aos guardas prisionais. Mas o seu passado está longe de ser pacífico. O SOL apurou que, na década de 80, 'Toni' esteve ligado a elementos que integraram as FP-27, um grupo terrorista liderado pelo chamado grupo dos 'Cavacos' (irmãos Vítor e Faustino Cavaco), responsável por vários crimes violentos – entre homicídios e assaltos a bancos, hotéis e casas de câmbio – que espalharam o terror na zona do Algarve. Alguns elementos do grupo mataram quatro guardas prisionais durante a fuga da cadeia de Pinheiro da Cruz, em 1984.
António Pires voltou, entretanto, a estar a contas com a Justiça. Quando foi detido este mês, estava em liberdade condicional, recém-condenado a uma pena de dois anos e seis meses de prisão por furto qualificado. O irmão, que tem cadastro por furto e viciação de automóveis, foi detido no passado dia 17 e também ficou em prisão preventiva.
Nas três buscas domiciliárias, em Samora Correia, Marinhais e Loures, os militares do núcleo de investigação criminal do destacamento de Grândola apreenderam diversos documentos e ferramentas utilizadas no furto e viciação de chaves, canhões de fechaduras, portáteis, aparelhos GPS, nove mil euros em dinheiro, uma pistola e uma caçadeira.
A GNR suspeita que os arguidos contaram com o apoio de outros cúmplices e que está em causa uma rede de maiores dimensões.