Livrem-nos desta Justiça

Cada vez que vejo os políticos, cheios de unção, a garantirem que apoiam a nossa Justiça, sinto um arrepio de indignação.

Bem sei que há um problema universal sobre o controlo da Justiça, no desejável sistema de divisão de poderes. Mas parece-me que nunca, em nenhum outro lado, a Justiça aproveitou a falta de controlo externo a que está sujeita de forma tão pouco ética como em Portugal. Tive experiências directas que o provaram bem. E vejo que os governos, a acabar neste (e nem vale a pena falar no extravagante drama do Citius), nada fizeram para a melhorar. Nem os Legisladores, talvez habituados que estavam a não ser incomodados (continuam a só ser incomodados depois de saírem do Poder, desde o futebol à politica).

Então é admissível um juiz decidir manter-se num posto justicialista e exibicionista, bastando-lhe para isso recusar promoções (já não se fala em merecidos castigos)?

Até o caso José Sócrates me incomoda. Porque imaginava haver razões suficientes contra ele (a quem vi enriquecer de maneira incompreensível), e constatei pela acção pública um carácter que não desejo para um político democrata, mas noto agora não haver nada de concreto utilizável em tribunais a sério. O que a investigação atira para uns jornais, é o oposto do que essa mesma investigação atira para outros jornais, às vezes do mesmo grupo proprietário. Até já ouvi alguém, baseado nessas fugas de informação, garantir que o Grupo Lena apareceu ou cresceu sob Sócrates (esquecendo as suas origens, na Leiria dos anos 50, e a construtora a funcionar desde 1974, estando já há anos o seu fundador, António Vieira Rodrigues, a viver no Brasil, onde se lhe reúnem os filhos regularmente para as decisões estratégicas). 

E não vi ninguém referir-se ao inexplicável apoio do Governo de Sócrates aos computadores Magalhães (que nunca me interessaram, nem para os filhos mais pequenos), ou às suas relações com grupos como o Visabeira – sabendo que, quanto ao BES, os pecados abundam em todos os partidos do chamado ‘arco do Governo’. E depois de espalharem acusações, concentradas no Grupo Lena por facilidade de um ex-administrador ser amigo do referido Sócrates, ainda se admiram que este também queira bolçar coisas para os jornais (pelos vistos, indesmentíveis)? E aceita-se o depoimento de um ex-chauffeur, que tem de falar a gostio do juiz, para não passar o Natal em prisão preventiva (eu disse juiz? Mas é-o? Que Justiça…)?

E que tal o arquivamento do processo dos submarinos, em que os alemães condenaram os corruptores de portugueses, mas os investigadores e a Justiça portugueses não conseguiram fazer condenar cá ninguém? E que tal a estranhamente assumida alegria de Paulo Portas com a situação?

Deus nos livre desta Justiça. A sério que há quem acredite nela e a respeite? Hum… deve ser só conversa de circunstância…