O que deve mudar para que a mutilação genital não fique impune

Todos os casos de mutilação genital que chegaram até hoje aos tribunais acabaram invariavelmente arquivados. O SOL falou com uma jurista que já teve em mãos vários processos relacionados com esta prática. 

A magistrada do Ministério Público, que preferiu não ser identificada, defende várias alterações à lei para que os autores da mutilação não permaneçam impunes. Desde logo, considera essencial o “alargamento do prazo de prescrição [dez anos]” do crime. 

Além disso, defende, deveria ter-se em conta, na tipificação do crime no Código Penal, a definição aprovada pela OMS, UNICEF e UNFPA, segundo a qual ‘mutilação genital feminina é todo e qualquer procedimento que envolva a remoção parcial ou total dos órgãos genitais femininos ou que provoque lesões nos mesmos, tendo por base razões culturais ou fins não terapêuticos’. 

A procuradora vai mais longe e diz que também devem ser criminalizados os “actos preparatórios”, como por exemplo “a organização de viagens para os países de origem para submeter as meninas a esta prática”. 

Quanto aos meios de investigação, “seria importante prever-se a possibilidade de escutas telefónicas e intercepção de outras comunicações, em qualquer uma das modalidades de crime, bem como a possibilidade de recolha de imagens e sons, igualmente em qualquer das modalidades de crime”.

Estão neste momento em discussão na especialidade três projectos de lei apresentados pelo CDS, PSD e Bloco de Esquerda, que querem autonomizar o crime de mutilação genital feminina, para que tenha moldura penal própria e se torne um crime público por si só. Actualmente, esta prática enquadra-se no crime de ofensas à integridade física (simples ou graves).

sonia.graca@sol.pt