Durante esses dias de sessões contínuas o museu estará excepcionalmente aberto para os insones que queiram ver o The Clock às horas esquecidas da madrugada. Mas, avisa Christian Marclay, para quem tema aborrecer-se com o esforço, não se trata de um projecto de endurance. «Eu próprio nunca vi o filme de uma só vez».
O projecto começou em 2007 e levou três anos a concretizar-se com ajuda de assistentes de pesquisa. São milhares de clips de filmes de todo o mundo que foram colados tendo como fio condutor imagens do tempo, quer seja de um relógio ou de alguém que diz as horas, ou outras formas mais subtis que o cinema encontrou de marcar o avançar dos minutos.
The Clock é uma colagem de fotogramas de várias décadas, de vários movimentos artísticos, geografias diferentes. Há westerns, musicais, a nouvelle vague francesa, o neo-realismo italiano e, provavelmente, disse Marclay , imagens de um filme português que talvez seja de Manoel de Oliveira. «Mas não posso garantir, não sou bom com nomes», disse o artista na apresentação à imprensa. Dominante mesmo é a produção de Hollywood, minoritária é a presença de Bollywood, cinema feito de dança e fantasia, onde a conexão com o tempo real não é importante. «A minha assistente disse que não havia relógios nos filmes indianos. Apercebi-me mais tarde de que havia»
O filme é exibido em tempo real. Se aparecer um duelo de um western ao meio-dia serão exactamente 12 horas no relógio dos espectadores. Poderia ser aborrecido ver o tempo a passar, mas o resultado é uma experiência fascinante onde vemos como o cinema é uma das artes que mais faz parte da nossa vida. E é isso que Christian Maclay quer: que a vidados que passam pelas muitas salas onde o filme tem sido mostrado se cruze com a sua obra. «As pessoas vêem um bocadinho antes de ir para o trabalho . Ou à tarde e têm que interromper porque vão buscar os filhos e se calhar isso também vai acontecer no ecrã. Se às 3 da manhã a pessoa no público está a bocejar se calhar no ecrã aparece alguém também com sono».
O interesse do filme, além do trabalho de pesquisa monumental, são os links, as associações de conteúdo na mesa de montagem. Um processo divertido «e muito orgânico» que passou por dar uma ilusão de continuidade a imagens díspares. São milhares de clips — «não contei quantos, não achei que fosse informação relevante», diz Marclay . A parte mais difícil foi encontrar imagens entre as 4 da manhã e as 6h. «Às 6h30 já há muitos despertadores a tocar. Às 4 da manhã não há nada a acontecer. E se o telefone toca a meio da noite, o mais provável é que seja às 2 da manhã», explicou Christian Marclay.
O filme concebido como uma gigante colagem, e ao abrigo da legislação que permite citações nas obras de arte, foi feito sem autorizações de copywright. «Se pedíssemos todas as autorizações ou diriam que não ou se dissessem que sim iriam pedir muito dinheiro. De qualquer maneira, tem tido tanto sucesso que acho que agora um produtor ficaria mais chateado por o seu filme não aparecer».
Até 19 de Abril o filme poderá ser visto aos bocadinhos, entre as pausas da vida ou de um só fôlego, se alguém for doido por bater records. Seja como for The Clock é uma experiência cinematográfica que nos deixa agarrados ao ecrã e a consumir sem moderação.
A entrada é gratuita.