Não sei como fui dar comigo, ao lado da minha mulher, este sábado, a ver o Festival da Canção, na RTP1. Não devia haver mais nada de jeito, e ela sintonizou ali a nossa TV. O momento mais dramático foi ouvir Simone de Oliveira, a tentar cantar ‘À espera das canções’. Mas como o público presente a acarinhava muito com palmas, cheguei a pensar que o defeito era meu, e a consensualidade dela daria para uma vitória folgada. Afinal não, e eu fiquei mais descansado com as minhas apreciações. É que Simone parecia um daqueles padres sem voz, que se atiram briosos para uma Missa cantada, engrolando as frases num mau monólogo, e alevantando um pouco a voz no final de cada frase, para dar o ar de canção. Assim me pareceu realmente ela.
Mas vá lá: não ganhou. Nem sei se os outros seriam melhores, mas eram seguramente menos patéticos. Claro que já lá vai o tempo (divertido sob todos os pontos de vista) da Toirada. Mas aí não houve Simone: foi a voz de Tordo com um poema de Ary (bom Festival, esse). De resto, com Simone, vale o que dizia o imperador Caracala: os mortos merecem todas as homenagens, desde que tenhamos a certeza de que estão bem mortos. E Simone, como cantora, está afectivamente mortíssima. Pelo que não vale a pena regatear-lhe aplausos.
Até Júlio Isidro, vindo da cova dos tempos, parecia mais desenvolto na apresentação – não ficando nada atrás da sua jovem colega Catarina Furtado. E Paulo de Carvalho, ainda a cantar bem, metia num chinelo o filho (que preferia ostentar outras exuberâncias). Portanto, nem só a idade mata.