Dinheiro dos Certificados de Aforro usado para pagar ao FMI

O encaixe acima do esperado com a corrida aos Certificados de Aforro em Janeiro deu uma ajuda preciosa para o Governo conseguir antecipar o reembolso do empréstimo do FMI. Fonte oficial do Ministério das Finanças explicou ao SOL que os seis mil milhões de euros que vão ser pagos já em Março serão retirados de…

Dinheiro dos Certificados de Aforro usado para pagar ao FMI

«O Tesouro já fez duas emissões sindicadas e dois leilões de Obrigações do Tesouro (OT), para além de ter obtido um encaixe relevante com os Certificados de Aforro e os Certificados do Tesouro em Janeiro. Estes montantes permitem agora reembolsar o FMI no montante anunciado», adiantou ao SOL o gabinete de Maria Luís Albuquerque.

Em Janeiro, milhares de portugueses correram aos balcões dos CTT para subscrever produtos de poupança do Estado. Com novas regras que entraram em vigor em Fevereiro, os juros destes produtos tornaram-se menos atractivos. Muitas famílias optaram então por aplicar dinheiro na antiga série dos certificados.

FMI cobra 3,6%

Estes produtos financeiros são uma forma de dívida pública e o Estado encaixou mais de 1,9 mil milhões de euros com o 'frenesim' de Janeiro. Esta verba soma-se aos montantes que o Estado captou em operações de mercado com investidores institucionais – bancos, fundos de investimento, fundos de pensões, etc. – e vai agora servir para pagar ao FMI.

O plano do Governo é antecipar o reembolso de 14 mil milhões de euros, do total de 28 mil milhões de euros que Portugal deve ao Fundo. Na última sexta-feira, Maria Luís Albuquerque anunciou que seis mil milhões serão pagos já em Março. O que falta para os 14 mil milhões será conseguido com o financiamento de mercado e pago até meados de 2017. «Durante o ano, prosseguir-se-á com o plano de financiamento, na antecipação dos reembolsos regulares de OT de 2015 e 2016», acrescentou a mesma fonte.

Estado poupa

A presidente do IGCP, o organismo que gere a dívida pública, adiantou esta semana no Parlamento que Portugal irá emitir mais dívida do que o previsto inicialmente para fazer face ao reembolso do FMI. Cristina Casalinho explicou que a alteração de seis mil milhões de euros no plano de financiamento para este ano implica mais quatro mil milhões de euros nas emissões.

O reembolso antecipado ao Fundo permitirá obter poupanças, uma vez que o Estado consegue financiar-se com juros mais baixos do que os aplicados pelo FMI no empréstimo que fez a Portugal. A taxa média do FMI é de 3,6% ao ano, quando o Estado consegue hoje financiar-se a 1,9%.

O Ministério das Finanças não tem ainda uma estimativa precisa sobre o montante total de poupanças, já que esse valor dependerá das condições de financiamento que o Estado encontrar quando for ao mercado.

Cristina Casalinho adiantou que as poupanças totais poderão atingir cerca de 700 milhões para os 14 mil milhões de euros. Só este ano, o reembolso antecipado permitirá uma poupança «na ordem dos 100 milhões de euros».

As projecções do IGCP são mais optimistas do que as de Bruxelas. No Eurogrupo que aprovou o reembolso antecipado, o comissário Pierre Moscovici adiantou que a poupança total gerada seria de 500 milhões de euros.

Segundo explicou ao SOL uma fonte de Bruxelas, a estimativa referida por Moscovici resulta de estudos conjuntos da Comissão Europeia, do BCE, do FMI e do Mecanismo Europeu de Estabilidade. E diz respeito à poupança total gerada até 2024 – o ano em que Portugal deixará de pagar ao FMI o empréstimo que recebeu, de acordo com o plano inicial: «As poupanças líquidas de juros até 2024 são cerca de 500 milhões de euros, ou cerca de 0,25% do PIB projectado», explicou a mesma fonte.

A poupança média anual na próxima década poderá assim atingir 70 milhões de euros por ano e aligeirar picos de reembolsos que prometem fazer mossa nas contas públicas. Dentro de quatro anos, Portugal terá de pagar anualmente quase 4,8 mil milhões de euros ao FMI – cerca de um terço dos encargos com dívida previstos para esse ano. Ainda não é conhecido o plano de reembolso já com o pagamento antecipado.

Sexta reestruturação de dívida

Não é a primeira vez que Portugal faz uma reestruturação da dívida pública desde o início do programa de assistência financeira assinado em 2011 (ver caixa).

Além das recompras de dívida que ocasionalmente o IGCP faz, o Estado já conseguiu por cinco vezes adiar o pagamento de dívida ou obter juros mais baixos – seja por condições mais favoráveis acordadas com Bruxelas, seja por operações de troca de dívida no mercado.

joao.madeira@sol.pt