Ídolos, YouTube e um pouco mais

      

O concerto tinha terminado pouco antes. Diogo Piçarra estava nos bastidores a descomprimir quando apareceu um pai com a filha. A menina aproximou-se do cantor e começou a tocar-lhe na cara. “És tão bonito”, disse-lhe. A rapariga era cega e, explicou o pai, esta era a maneira que tinha de conhecer o cantor.

O episódio foi um dos muitos que este algarvio viveu com as fãs desde que ganhou a última edição do concurso de talentos Ídolos. “Gosto que venham falar comigo, é sinal que sou reconhecido”.

Mas a vida deste jovem de 24 anos não girou sempre à volta da música. Esta só começou a fazer verdadeiramente parte do seu mundo por volta dos 16 anos, quando decidiu aprender a tocar bateria. “O meu pai não deixou porque fazia muito barulho. Então fui aprender guitarra”.

Integrou uma banda de pop rock, os Fora da Bóia – de que não era sequer o vocalista principal, mas compunha as canções. “Descobri aí a minha veia de escritor e de compositor”. A experiência teve um final abrupto, quando foi para a República Checa para terminar o curso de Línguas e Comunicação e acabou por ser expulso pelos outros membros da banda.

Quando regressou a Portugal, Diogo começou a gravar covers com a ajuda do irmão gémeo, e a publicá-las no YouTube. “O André sempre foi 'a cabeça' disto tudo. Foi ele que filmou os meus vídeos e fotografias, e que os editou. Sem ele acho que não tinha feito nada”.

A estes vídeos seguiram-se actuações em bares. Foram “uma escola de vida”, revela. “Já tinha cantado em bares com a banda, mas sozinho foi difícil. Estar a cantar e ninguém ouvir, dedicar uma canção a alguém e ninguém bater palmas… Aprendi muito com esses silêncios”.

Em 2012, tudo mudou. À sua revelia, a mãe e o irmão inscreveram-no no Ídolos, programa a que se tinha candidatado em 2009, mas não se qualificara. No primeiro casting chamou a atenção ao cantar uma música de Pedro Abrunhosa, um dos jurados do programa. “Quando cheguei, perguntaram-me que música é que ia cantar. Eu respondi 'Se Eu Fosse um Dia o Teu Olhar' e só ouvi as pessoas da produção a suster a respiração, como se ficassem com falta de ar”.

Mas o momento que o fez destacar-se na competição foi a interpretação de 'Skinny Love', de Bon Iver, ao piano – instrumento que aprendera a tocar apenas dois dias antes. Depois de meses de trabalho e de um esforço que o fez perder cinco quilos, ganhou o Ídolos.

Pouco depois já estava a actuar em pequenos concertos. O concurso fê-lo também rumar a terras de Sua Majestade, graças a um curso de música na London Music School. Ao longo dos seis meses, continuou a gravar versões de músicas e fez um documentário do seu dia-a-dia na capital britânica. “Sabia que não podia desaparecer, tanto a nível pessoal como musical. Portanto, mesmo estando longe, tentei sempre estar presente”.

A legião de fãs manteve-se. “Elas costumam enviar-me mensagens e eu respondo. Uma vez, houve um namorado que não gostou e disse-me que fazia isto e aquilo se eu voltasse a responder à namorada”.

Diogo Piçarra tem perto de 100 mil likes na sua página de Facebook, mais de 10 mil seguidores no Twitter, 17 mil no Instagram e 69 mil subscritores no YouTube. O investimento nas redes sociais valeu-lhe um reconhecimento internacional, com a sua versão de 'All of Me', de John Legend. Estava no estúdio, de madrugada, a preparar o seu álbum, quando decidiu fazer um cover da canção. “Pus-me de joelhos no chão, com a câmara à frente. Filmei e coloquei no YouTube, em privado. Pensava eu”.

Dias depois, John Legend incentivou os fãs a partilhar as versões da sua música, através do Twitter. As melhores seriam repartilhadas pelo próprio – a de Diogo foi uma das seleccionadas. “Ainda hoje recebo mensagens de franceses, chineses, espanhóis e mexicanos”.

Passados três anos da vitória no Ídolos, Diogo apresenta o seu primeiro álbum, Espelho. Para o concretizar contou com a ajuda de Fred Ferreira, produtor dos Buraka Som Sistema. As sonoridades reflectem as referências musicais do cantor: desde a electrónica de James Blake ao pop de Ed Sheeran e dos One Republic, passando pela simplicidade das canções de Sam Smith.

Diogo lembra-se bem da primeira vez que ouviu o single 'Tu e Eu' na rádio: “Tinha ido sair à noite e estava a voltar para casa, de carro, sozinho, às duas da manhã. De repente começa a tocar a música. Ainda olhei para o telemóvel, mas era mesmo na rádio. Pus o rádio aos berros e ainda deitei uma lágrima”.

rita.porto@sol.pt