No recurso entregue na passada terça-feira no Tribunal da Relação de Lisboa, Rui Cruz defende que o Ministério Público (MP) é parte interessada na investigação, sabe o SOL. Isto porque entre os 2.000 procuradores e funcionários que viram os seus nomes e telemóveis divulgados pelos piratas informáticos no ataque ao site da Procuradoria-Geral da República (PGR), a 25 de Abril do ano passado, está o do coordenador do Gabinete de Cibercrime, Pedro Verdelho, que conduziu os interrogatórios ao editor do Tugaleaks, arguido no caso.
Na prática, segundo advogados ouvidos pelo SOL, se este argumento for aceite pelos desembargadores que analisarem o recurso, isso significa que a investigação terá de passar a ser conduzida pelo MP de um tribunal superior – neste caso, na Relação de Lisboa. E se também estes procuradores tiverem visto os seus nomes divulgados, poderá terminar no MP do Supremo Tribunal de Justiça.
Proibição de acesso à internet é punição
No recurso, a defesa do jornalista – detido com mais seis alegados hackers a 26 de Fevereiro passado – contesta uma das medidas de coacção que lhe foram aplicadas: a proibição do acesso à internet. A medida é considerada uma punição pela divulgação de notícias dos ataques e um atentado aos direitos liberdades e garantias de Rui Cruz, nomeadamente do direito ao trabalho, já que o arguido, de 28 anos, com carteira profissional de equiparado a jornalista, ficou impedido de exercer a profissão. Foi também despedido da empresa onde prestava serviços e que trabalhava com a PT .
A defesa alega ainda que o fundador do Tugaleaks limitou-se a escrever notícias sobre os ataques informáticos aos organismos oficiais, que noticiou em primeira mão, e que desta forma se está também a limitar a liberdade de imprensa.
Já os investigadores, sabe o SOL, consideram que Rui Cruz não só apoiou estes ataques, através da publicação de notícias, como terá mesmo incentivado a intrusão dos piratas ligados aos Anonymous no site da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, com quem tem um litígio. O site deste organismo foi atacado a 2 de Fevereiro passado, tendo sido divulgados dados pessoais de jornalistas. O fundador do Tugaleaks é por isso suspeito de acesso ilegítimo e indevido e de sabotagem informática.
A ligação de Rui Cruz a alguns dos hackers é outro argumento usado pelo MP, que alega que no Tugaleaks foram publicados ficheiros de dados de ataques informáticos, num formato diferente daquele que os Anonymous revelaram através do Facebook, suspeitando-se que lhe terão sido dados directamente por outro dos detidos na operação.
Ataques feitos em casa
Ao que o SOL apurou, Rui Cruz será, contudo, o único dos suspeitos detidos inicialmente na investigação em que não foi encontrado nenhum rasto informático directo aos ataques. No caso dos restantes seis detidos, sabe o SOL, o MP tem provas da ligação dos endereços de IP aos sites pirateados. Alguns dos ataques foram feitos pelos suspeitos nas suas próprias casas, havendo registos dos do dia e hora de cada acesso.
Entre os hackers suspeitos, que aguardam a conclusão do inquérito em liberdade, estão membros de vários grupos ligados aos activistas Anonymous, como os Outsidethelaw, os Sidekingdom12 e o Sudoh4k3rs. Entre eles está o líder do grupo Hackerstreet, que juntamente com um dos membros do Sidekingdom12 e outros três membros do Sudoh4k3rs terá estado envolvido nos ataques ao site da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (que ficou uma semana inoperacional) e à divulgação dos nomes e contactos telefónicos dos magistrados.
joana.f.costa@sol.pt