Uma senhora muito amada
Margarita Suárez, habitante de Mérida, no México, morreu. Era conhecida por alimentar animais vadios no bairro em que vivia. A sala funerária onde o corpo estava a ser velado foi visitada por cães e até um pássaro. Os cães apareceram porque todas as manhãs se dirigiam a casa de Margarita, que os alimentava e tratava deles. Sempre que saía de casa, levava alguma coisa com ela para dar de comer aos animais que encontrava na rua. No magnífico site Bored Panda estão imagens dos cães deitados na sala. Só se foram embora quando o corpo foi cremado. Na notícia disseram que os cães foram apresentar as suas condolências. É provável que se tenham sentido desamparados. Também é possível que estivessem à espera que Margarita acordasse. Nunca saberemos o que lhes deu. Certamente sentiram o mesmo do que nós, animais humanos. Quando morre alguém que nos ama, o mundo fica desorganizado, a nossa vida desorientada e os nossos hábitos deixam de fazer sentido.
Polícia da indignação
Há uma nova profissão nos dias de hoje: polícia da indignação. A medida é o ataque terrorista ao jornal satírico Charlie Hebdo, que resultou em 12 mortos. Logo após o ataque, apareceu um slogan em defesa da liberdade de expressão, 'Je suis Charlie', partilhado nas redes sociais por muitas pessoas que se solidarizaram com as vítimas e com um modo de vida que condena a violência como resposta ao insulto. A partir desse momento, sempre que há um massacre, aparecem os polícias a reclamar pela dose de indignação que pensam ser devida a qualquer ocasião terrível. Pergunto o que pretendem estas pessoas. Será que minimizam o ataque ao Charlie Hebdo? E por que será que reclamam para si um direito especial de exigir ao próximo que se indigne de igual modo com o que de mais terrível acontece no mundo? Quem lhes conferiu esse direito? E desde quando a indignação passou a ter um valor moral? Há quem queira tornar a sua vida impossível. E a dos outros também.
Kindle (2008-2015)
O meu Kindle perdeu o pio. Após uma vida bastante longa, o aparelho deixou de aceitar ser carregado. Pifou, portanto. Um dia nem o milagroso reinício, com o dedo na tecla de on/off durante não sei quantos segundos, foi capaz de o devolver ao nosso convívio. Acho que o vou guardar na despensa. Não vou ser capaz de deitar fora o electrodoméstico responsável por mudar a minha maneira de ler. Não falo do conteúdo mas realmente do suporte electrónico, que facilita a leitura em certos momentos, como a sala de espera do dentista. Começou assim, mas na verdade tornou-se uma companhia mais presente e muitas vezes substituiu os livros em papel. O Kindle não mudou só o formato em que habitualmente lia, mas também me deu a oportunidade de comprar os livros que quero sem ter de esperar pela entrega em casa. Talvez esta seja a maior revolução do Kindle: a de não ter de esperar um minuto até poder começar a ler o que se quer. Desde que exista na Amazon.
Mãe e filho
Para o meu gosto, o melhor canal de televisão chama-se eloquentemente TV Séries. Dou cinco euros por mês e recebo em troca óptimas séries de televisão. É neste canal que continuo a ver Bates Motel, agora na sua terceira temporada. Bates Motel é uma prequela demorada do filme Psycho de Alfred Hitchcock, que nos apresenta episódios da vida quotidiana atribulada de Norman Bates, que conhecemos como Anthony Perkins, com a mãe, que no filme faz uma aparição muito breve. A proposta interessante é imaginar como teria sido a adolescência do psicótico Bates e que relação teria com a mãe. A série é extraordinária por causa da interpretação de Vera Farmiga, ainda mais manipuladora na terceira temporada, e de Freddie Highmore, um Norman Bates tão perturbado e infantil como o adulto que nos apareceu em Psycho. Bates Motel tem uma série de histórias cruzadas, mas é esta relação doentia entre a mãe e o filho que a sustenta. Vale a pena seguir só por isto.