Está tudo bem
Dei uma gargalhada sonora quando ouvi o Secretário de Estado da Saúde Leal da Costa a comentar uma reportagem da TVI feita com câmara oculta aos serviços de urgências de quinze hospitais ao longo de um mês. Penso que me ri alto quando ouvi Leal da Costa dizer que tinha visto «pessoas bem instaladas, bem deitadas em macas anti-queda». É uma frase extraordinária, tendo em conta aquilo que vimos: demasiadas pessoas a precisar de ajuda e horas à espera de serem atendidas, amontoadas e arrumadas em macas. A parte das macas é verdadeira, mas revela que Leal da Costa pensa que podíamos estar no Burundi e que até é uma sorte não estarmos. Há duas perguntas a fazer neste caso em particular. A primeira é: para onde vai o dinheiro dos nossos impostos? A segunda diz respeito à desenvoltura preocupante do Secretário de Estado. Por que razão Leal da Costa se viu na necessidade de comentar e fazer política com o sofrimento das pessoas? Ficam ambas por responder.
Obviamente, chumbada
A actriz Gwyneth Paltrow foi desafiada pelo célebre chef Mario Batali a viver uma semana como vivem cerca de 47 milhões de americanos: com 29 dólares de subsídio de alimentação (ou food stamps). Gwyneth fez umas compras estranhas no primeiro dia, só à base de fruta, ovos e legumes, e que incluíam sete limas. Foi olhada de lado pela comunidade Twitter do costume, que achou as escolhas pouco realistas para um orçamento tão magro. Ao quarto dia, Gwyneth Paltrow desistiu do desafio e confessou que tinha comprado um frango. Quando quis explicar por que razão tinha aceitado o desafio, respondeu que era preciso chamar a atenção para os cortes nos food stamps. A pergunta é se o terá conseguido fazer ou se o resultado terá sido uma humilhação velada de quem pouco tem para viver. Gwyneth terminou por dizer: «Estou grata por poder dar comida de boa qualidade aos meus filhos». Fica confirmado que é das celebridades mais tolas e desagradáveis do planeta.
Salva pela segunda vez
Diz-se que a sorte não bate à mesma porta duas vezes, mas não estou assim tão certa deste provérbio. A repetição faz parte da vida e por isso é natural que por vezes até tenhamos sorte nas mesmas circunstâncias duas vezes. Há tempos fiquei parada em plena Av. da República, porque o meu carro se recusava a andar. Considero isto um azar, mas na verdade era uma questão de cilindros. Chamei o ACP, paguei as quotas em atraso e tudo se arranjou. Mas parece que o carro tem três cilindros. Há menos de uma semana fiquei de novo parada na Av. Miguel Bombarda, quase a entrar na Av. da República. O problema? O carro soluçava e recusava andar. Parei e voltei a chamar o ACP. Apareceu o mesmo mecânico, simpático e prestável, que olhou para mim e disse: «Não lhe aconteceu o mesmo há uns tempos ali mais em baixo?». Foi, exactamente, até percebi o que era pelos sintomas do carro. Mais um cilindro, mais um azar e ainda mais uma sorte. Duas vezes salva pelo ACP.
Dois amigos
A amizade pressupõe uma igualdade de caracteres, de personalidade, de disposição. É uma actividade humana que pressupõe desinteresse e reciprocidade. A amizade está neste sentido nos antípodas do serviço prestado por uma corporação ou empresa, como o ACP ou como a Amazon. Há, no entanto, uma fluidez e um profissionalismo tão grandes em certas empresas, que começamos a achar que estão próximas. Ou então sou eu que me comovo quando as coisas correm bem e atribuo um valor sentimental ao que não tem. Há dias, chegou o novo Kindle e não estava ninguém em casa para o receber. Passados uns minutos, tinha uma mensagem a dizer que o podia ir buscar a uma empresa em Alcântara ou ligar para combinar uma nova hora. A curiosidade foi mais forte e fui buscar o brinquedo novo. Apesar do percalço, senti que havia 'alguém' que estava em cima do acontecimento no que respeita à encomenda. Sou cliente do ACP e da Amazon, mas a verdade é que os vejo como amigos.