A confusão instalada ficou exposta nas quatro sondagens publicadas na segunda-feira: duas davam a vitória aos conservadores do actual primeiro-ministro David Cameron, enquanto outras duas antecipavam que os trabalhistas de Ed Miliband venceriam o voto popular. Comum entre elas, só a certeza de que nenhum dos dois estará perto de garantir a eleição dos 326 deputados necessários para governar com maioria parlamentar.
Um problema que poderia ser resolvido com o terceiro Governo de coligação desde o fim da II Guerra Mundial, que até seria o segundo consecutivo. Mas, para mal dos pecados dos actuais governantes, conservadores e liberais democratas preparam-se para acumular perdas de mais de meia centena de deputados. As sondagens mais simpáticas para a dupla Cameron e Nick Clegg dão à aliança cerca de 310 deputados, cenário que nem a chamada dos unionistas democratas da Irlanda do Norte resolveria.
Fim da Escócia trabalhista
Em qualquer outro momento da vida política britânica, essas contas abririam a porta à vitória dos trabalhistas, que se preparam para 'roubar' cerca de 30 deputados aos conservadores e 10 aos liberais. Para Ed Miliband o drama consiste no facto de o nacionalismo escocês estar a atingir o auge, apenas meio ano depois da derrota no referendo à independência (ver Tabu).
Dos 59 deputados a eleger na Escócia, o partido somou 40 em 2010 – um resultado semelhante ao obtido em todas as votações das décadas anteriores. Agora prepara-se para perder entre 31 a 36 representantes para o Partido Nacional da Escócia (SNP), limitando a cerca de uma dezena de deputados os ganhos em relação a 2010 – votação em que se apresentou com o desgaste de 13 anos de governação.
O impasse podia ser solucionado com uma aliança anti-austeridade, que permitiria ao Labour liderar um Governo com vários pequenos partidos, do centro à esquerda. Mas essa solução obrigava Miliband a juntar-se ao SNP e ao Partido Social Democrata e Trabalhista da Irlanda do Norte (SDLP), cujo programa também defende a independência do seu país. Algumas sondagens abrem até a porta a uma maioria formada apenas entre Labour e SNP, mas apesar da disponibilidade demonstrada pela escocesa Nicola Sturgeon a hipótese representa um risco político que Miliband tenta evitar a todo o custo.
«Quero deixar isto bem claro: não haverá coligações, nem aproximações, nem acordos pontuais. Não vou fazer acordos com o SNP», repetiu no domingo o actual líder da oposição. Mas, ao mesmo tempo, Miliband lembrou «a forma como funciona a Câmara dos Comuns», dizendo que se acabar como partido mais representado apresentará o seu programa «e os restantes partidos votarão».
O antigo ministro da Energia e Alterações Climáticas no Governo de Gordon Brown aposta assim num apoio parlamentar dos escoceses sem vínculo formal. Seria uma forma de impedir as constantes acusações dos conservadores, que passaram a campanha a alertar os eleitores para uma aliança que deixará os trabalhistas «reféns» dos escoceses.
Sistema também abana
Outra cartada que Miliband poderá ter na manga está descrita no seu programa como uma «convenção constitucional liderada pelo povo», que resultaria de uma crise política provocada pela incapacidade dos deputados em aprovar a formação de um Governo. Algo que poderia resultar numa espécie de Governo de unidade nacional com a missão específica de promover uma reforma constitucional.
Miliband poderia oferecer uma reforma no sistema eleitoral aos liberais, que ao longo das últimas décadas foram as principais vítimas de um fenómeno que este ano deve atingir o UKIP: as sondagens indicam que os eurocépticos de Nigel Farage devem ficar-se pela eleição de três deputados apesar de poderem atrair 14% do eleitorado nacional. Clegg exigiu isso a Cameron em 2010, mas o melhor que conseguiu foi referendar a troca do actual sistema por outro que também não era do seu agrado e que convidava os eleitores a votar em vários partidos por ordem de preferência. O Voto Alternativo foi chumbado em 2011 por mais de dois terços do eleitorado.
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