Banco de Portugal quer cortes salariais no privado

Estudo indica que 80% dos funcionários do sector privado mantiveram o salário-base durante a crise. Banco central pede mais flexibilidade salarial para diminuir o desemprego.

O Banco de Portugal (BdP) considera que a reforma laboral feita pelo Governo está inacabada e insiste em medidas que facilitem a vida às empresas durante os períodos de crise. No Boletim Económico de Primavera publicado esta quarta-feira, os técnicos do regulador estimam que 80% dos trabalhadores do sector privado tenham mantido o salário-base inalterado durante a crise. Com maior flexibilidade para reduzir vencimentos, alega o BdP, o desemprego não seria tão elevado.

Segundo o relatório, o ajustamento na crise dos últimos anos recaiu sobretudo nos salários da Função Pública e no nível de emprego. E, segundo o Boletim, a «persistência de elevados níveis de desemprego envolve custos económicos e sociais muito assinaláveis». O organismo de Carlos Costa defende assim medidas que «aumentem a flexibilidade salarial».

Num capítulo do documento onde analisam o mercado de trabalho, os técnicos do banco central estudam o comportamento das empresas durante a crise recente, em termos de despedimentos e contratações.

Teoricamente, dizem os técnicos do BdP, o ajustamento nas empresas face à queda do volume de negócios poderia ser feito através de cortes nos salários reais dos trabalhadores ou no nível de emprego – ou uma combinação das duas medidas.

Mas o BdP sustenta que o sistema de negociação salarial em Portugal resulta num «grau de rigidez dos salários nominais que, quando combinado com uma baixa taxa de inflação, torna difícil ajustar os salários reais». Assim, a maior parte do ajustamento «fez-se à custa de reduções de emprego».

O banco central analisou o salário real médio dos trabalhadores que contribuem para a Segurança Social – um grupo constituído sobretudo por trabalhadores do sector privado.

Segundo os cálculos dos economistas, entre 2012 e 2013 cerca de 80% dos trabalhadores a tempo inteiro tiveram o seu salário-base inalterado. Houve cortes nas comissões e noutros suplementos em 60% dos trabalhadores, mas como esta componente dos vencimentos é diminuta, houve «um alcance limitado».

Com as restrições nos vencimentos, as empresas optaram assim por despedir, aumentando o desemprego. Nas crises dos anos 80, quando as empresas ainda podiam fazer ajustamentos reais do salários, com a inflação elevada, tal não aconteceu. «Não foi coincidência que entre 1984 e 1985, a taxa de desemprego só tenha aumentado de 9,1% para 9,6%», refere o relatório divulgado esta semana.

Desemprego sobe

Segundo dados do INE divulgados esta semana, a taxa de desemprego subiu pelo segundo trimestre consecutivo. Nos primeiros três meses do ano, atingiu 13,7% da população activa, acima dos 13,5% registados no trimestre anterior.

Existem actualmente 713 mil pessoas desempregadas no país (+2,1% face ao trimestre anterior). Por idades e escolaridade, o aumento trimestral da população desempregada penalizou sobretudo pessoas com mais de 45 anos e pessoas com frequência até ao terceiro ciclo do ensino básico. O sector dos serviços foi o que registou o maior aumento de desempregados.