A Arcada

Quando ia a Lisboa gostava de ouvir o meu avô designar a parte central da cidade – o seu centro cívico e comercial – por ‘Baixa’. No Porto era a mesma coisa: as pessoas também falavam da ‘Baixa’ quando queriam dizer o centro da cidade.   

O vocábulo tinha qualquer coisa de cosmopolita, era assim como uma espécie de downtown nova-iorquino… 

Em Braga não tínhamos nada disso, ninguém dizia 'Baixa' para designar o centro urbano – em Braga dizia-se 'Arcada'. Demorei tempo a cair sob o charme desta singularidade, mas finalmente percebi a riqueza da designação e a sorte de Braga não ser apenas mais uma urbe com Baixa. Em Braga não se vai à Baixa, vai-se à Arcada. E isso só acontece em Braga.

A Arcada propriamente dita começou por ser um conjunto de alpendres edificados no século XVI junto à muralha do castelo para albergar os almocreves, seus animais e mercadorias, que se dirigiam à urbe para comerciar, transformando-se assim em ponto de encontro e de convívio. 

Em 1715 esses alpendres foram substituídos por um longo coberto encostado à muralha medieval e apoiado em 19 arcos de pedra, passando os mercadores a negociar aí os seus produtos. 

Em meados do século XVIII apareceu nesse local um padre a pregar em honra de Nossa Senhora da Lapa, reunindo grande quantidade de fiéis, o que fez com que surgisse a ideia de aí se edificar uma capela. 

A ideia foi abraçada pelo arcebispo D. Gaspar de Bragança, que patrocinou a construção – sensivelmente ao centro das arcadas existentes – de um templo de reduzida dimensão, uma vez que ficava limitado pela muralha do castelo à qual as arcadas estavam encostadas. O templo foi inaugurado em 1767, com a designação de Igreja da Lapa. 

Por esta altura foi também colocada sobre a Arcada uma figura feminina segurando a Sé Catedral numa das mãos e um cajado na outra, escultura em granito a simbolizar Braga que seria depois transferida para o Arco da Porta Nova – metamorfoseado em arco triunfal por esse mesmo D. Gaspar de Bragança. 

Em 1857, num dos topos da Arcada, abriu o Café Vianna, o mais antigo café da cidade, a que se seguiram dois outros estabelecimentos congéneres no outro topo, o Astória e o Peninsular, este desaparecido na segunda metade do século XX. 

Mais ou menos por essa época, em 1885, foi acrescentado um piso ao alpendre existente, passando a Arcada a apresentar a fisionomia que hoje tem como espaço central do quotidiano bracarense.

Mas a Arcada não é apenas o edifício propriamente dito: é, por osmose, toda essa zona central da cidade, a começar pelo Largo da Lapa (desde 1910 designado Praça da República), que fecha o extremo poente do primitivo Campo de Santana. Este local, mandado abrir no século XVI por D. Diogo de Sousa, arcebispo renascentista que expandiu a cidade para fora das muralhas, foi transformado no século XIX em Passeio Público – um jardim romântico vedado -, constituindo desde 1913 a Avenida Central. 

E ainda hoje todos os acontecimentos e conversas citadinas da urbe se desenrolam neste espaço central tutelado pela Arcada.