Grande parte destes futuros, radiosos ou catastróficos, não chegou a acontecer, e os seus profetas, os optimistas e os pessimistas, foram desmentidos por uma História que lhes trocou as voltas. Da mesma maneira que alguns dos acontecimentos decisivos do nosso tempo e do nosso mundo não foram previstos nos milhares de prognósticos publicados e divulgados.
O fim e fragmentação da União Soviética foi um deles. Até 1986, só Emmanuel Todd e Hélène Carrère d'Encausse tinham encarado essa hipótese; todos os outros, todos esses profetas individuais e colectivos, escritores, historiadores, sociólogos, jornalistas, economistas, investigadores ao serviço de governos ou de grandes corporações, de think tanks ou de centros de pesquisa, davam como garantida a subsistência da URSS muito para além do ano 2000.
Francis Fukuyama celebrizou-se há 25 anos por ter profetizado o 'Fim da História': queria com isso dizer que o futuro estava condenado à globalização democrática; que com o final da Segunda e da Terceira Guerra mundiais teriam também acabado as concepções universalistas alternativas à democracia capitalista – o fascismo europeu vencido na Segunda Grande Guerra e o comunismo soviético vencido na Guerra Fria.
As críticas a Fukuyama vieram então em catadupa e repete-as, críticas que agora um republicano libertário, Rand Paul, vem reavivar citando os casos do partido único comunista-nacionalista chinês e o revivalismo nacional autoritário na Rússia. Sem falar do que vai pelo mundo árabe e pela África subsaariana.
Fukuyama esteve em Lisboa e pude confrontá-lo – com o Jaime Gama e o José Manuel Fernandes – sobre estes e outros pontos. Mostra-se agora mais cauteloso, reconhece que talvez a democracia esteja a andar para trás e que a sua qualidade se tenha deteriorado na Europa e nos próprios Estados Unidos.
A conversa está na edição online do Observador. A propósito da tradução em português do seu livro The Origins of Political Order (As Origens da Ordem Política, Dom Quixote, 2012; Ordem Política e Decadência Política, Dom Quixote, 2015) discutimos longamente os temas centrais do seu pensamento à luz de críticas e autocríticas, fazendo – sobretudo o Jaime Gama e eu – de advogados do diabo.
A terminar, perguntei-lhe por que seria que na literatura de ficção científica nunca aparecia uma sociedade futura que fosse 'democrática'. “I think it's because it's too boring…” (“Penso que é por ser muito aborrecida…”), a democracia, entenda-se.