Segundo Falciani, autor do livro "O Cofre-Forte da Evasão Fiscal", o modelo económico do "banco privado" baseia-se sobretudo na dívida pública, atualmente o meio mais importante de financiamento.
"Por um lado, os bancos podem obter dinheiro do Banco Central Europeu (BCE) pagando 0,5 por cento de juros, e por outo — utilizando o chamado "efeito de alavanca" -, podem comprar dívida pública num montante igual a 50 vezes aquele que obtiveram", explica o engenheiro informático que revelou a lista com milhares de nomes de titulares de contas do Hong Kong and Sanghai Bank Corporation (HSBC) em Genebra, em situação de evasão fiscal, incluindo portugueses.
De acordo com o engenheiro informático, "em média", os títulos do Estado proporcionam um juro de 2,5 por cento, ou seja, o quíntuplo da taxa que os bancos têm de pagar ao BCE.
"Se uma instituição obtém um milhão de euros do BCE, terá de pagar cinco mil euros de juros. Mas com aquele milhão, poderá adquirir títulos públicos no valor de 50 milhões, que lhe darão 1.250 mil euros de juros. Multiplicando este valor por centenas de milhares de milhões de euros apercebemo-nos das dimensões do fenómeno" (pag.197), escreve o autor do livro "O Cofre-Forte da Evasão Fiscal".
Sendo assim, explica, com a ajuda do "efeito de alavanca e sem menor esforço", os bancos podem ganhar muito dinheiro para investir nas especulações financeiras e na compra de nova dívida e não injetam recursos na economia real, não relançam o consumo, não investem na indústria nem na criação de emprego.
"Os especuladores aproveitam-se da desigualdade, precisam dela: este é o modelo económico atual. Temos de o inverter, e isto pode ser feito", defende o informático atualmente envolvido no banco ético francês, La Nef (Nouvelle Économie Fraternelle).
Para o especialista, "é necessário começar a usar a arma do inimigo" e criar empresas de fachada para resolver o problema da origem e denúncia dos dados utilizando "lugares" onde os dados não são de ninguém, como a Costa Rica ou o Equador, tal como fazem os bancos, "inimigos da igualdade pública", refere o informático que no livro relata o processo como acedeu aos dados e todo o processo judicial de que foi alvo depois da divulgação da lista.
Hervé Falciani, 43 anos, ítalo-francês, colabora com polícias de vários países, tendo permitido o acesso ao sistema informático do HSBC de Genebra.
A lista Falciani, onde constam cerca de 130 mil nomes de banqueiros, traficantes de droga, diamantes e armas, políticos, empresários, desportistas, entre outros, (incluindo portugueses) tornou possível a recuperação de milhões de euros resultantes da evasão fiscal.
Finalmente, Falciani lamenta não existir coerência entre as "afirmações dos políticos" contra a evasão fiscal e as normas que são promulgadas em proveito dos bancos.
"O problema é que os cidadãos não compreendem o que acontece ao seu dinheiro, absorvido pelo buraco negro da finança que, através dos paraísos fiscais, permite a concorrência desleal e subtrai recursos aos que mais precisam" (página 218), escreve.
Mesmo assim, conclui que está otimista porque o "sistema é frágil", sublinhando que dentro de uma empresa ou de um banco basta uma única pessoa contrária à manutenção do sigilo para "fazer saltar tudo".
O livro "O Cofre-Forte da Evasão Fiscal" de Hervé Falcini em colaboração com o jornalista italiano Angelo Mincuzzi (Temas de Debates/Círculo de Leitores, 247 páginas) foi lançado este mês em Portugal e inclui documentação e reprodução de transmissões entre gestores e clientes do HSBC- Privat Bank.
Lusa/SOL