Sócrates não deverá ser ouvido por Carlos Alexandre

José Sócrates não deverá ser ouvido pelo juiz de instrução criminal Carlos Alexandre sobre a alteração da medida de coacção proposta pelo Ministério Público. A notícia foi avançada pela TVI24 e revela que a não aceitação da pulseira electrónica, promovida pelo procurador Rosário Teixeira, não obriga a que o arguido seja ouvido presencialmente pelo juiz…

Hoje é o prazo limite para que o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal decida se a medida de coacção de prisão preventiva aplicada a Sócrates em Novembro se mantém ou é alterada para uma menos gravosa. De acordo com a lei, a aplicação da pulseira electrónica pressupõe a aceitação do arguido e Sócrates já fez saber ontem, numa declaração revelada pela SIC, que não aceita (Ver declaração na íntegra em baixo).

O Código de Processo Penal prevê a “obrigação de permanência na habitação” como medida de coacção, que pode ser fiscalizada através de meios técnicos à distância (a pulseira), mas depois a lei que regula a vigilância electrónica determina que, para isso, o arguido tem de dar o seu consentimento.

Agora, e tendo Sócrates recusado, segundo um magistrado consultado pelo SOL, o juiz de instrução Carlos Alexandre terá uma de duas opções: mantê-lo na cadeia de Évora ou determinar que vá para casa, ficando proibido de sair e de contactar com pessoas visadas ou envolvidas no inquérito. Neste caso, pode ser determinado algum meio acessório de controlo (um agente policial à porta, por exemplo).

Declaração de Sócrates, na íntegra:

"A minha prisão constituiu uma enorme e cruel injustiça. Seis meses sem acusação. Seis meses sem acesso aos autos. Seis meses de um furiosa campanha mediática de denegrimento e de difamação, permitida, se não dirigida, pelo Ministério Público. Seis meses de imputações falsas, absurdas e, pior – infundamentadas, o que significa que o Ministério Público não as poderia nem deveria fazer, por não estarem sustentadas nem em indícios, nem em factos, nem em provas. Seis meses, enfim, de arbítrio e de abuso.

Aqui chegados, que cada um assuma as suas responsabilidades. A minha prisão foi uma violência exercida injustamente contra mim, mas foi-o de forma unilateral – foi-me imposta. Esse acto contou sempre com o meu protesto e o meu repúdio; nunca com o meu silêncio e muito menos com o meu assentimento. Agora, o Ministério Público propõe prisão domiciliária com vigilância electrónica, que continua a ser prisão, só que necessita do meu acordo. Nunca, em consciência, poderia dá-lo.

Por outro lado, não posso ignorar – nem pactuar – com aquilo que, hoje, para mim, está diante dos olhos: a prisão preventiva usada para investigar, para despersonalizar, para quebrar, para calar, para obter sabe-se lá que “confissões”. Também não ignoro – nem pactuo – com a utilização da prisão domiciliária com vigilância electrónica como instrumento de suavização, destinado a corrigir erros de forma a parecer que nunca se cometeram. Estas “meias-libertações” não têm outro objectivo que não seja disfarçar o erro original e o sucessivo falhanço: depois de seis meses de prisão, nem factos, nem provas, nem acusação.

Meditei longamente nesta decisão, no que ela significa de sacrifício pessoal e, principalmente, no sacrifício que representa para a minha família e para os meus amigos, que têm suportado esta inacreditável situação com uma extraordinária coragem. Todavia, o critério de decisão é simples – ela tem que estar de acordo com o respeito que devo a mim próprio e com o respeito que devo aos cargos públicos que exerci. Nas situações mais difíceis há sempre uma escolha. A minha é esta: digo não."

carlos.santos@sol.pt