Vestidas para trabalhar

Adília Água, 32 anos, faz parte dos números que, todos meses, marcam a agenda da comunicação social e abrem debates sobre décimas a mais ou a menos nas listas oficiais: os do desemprego. Saída da Escola Básica dos Loios, onde trabalhava como auxiliar de educação, viu-se com dois filhos menores e a ter de ajudar…

“Procurava alguém que me ajudasse a perceber porque não consigo arranjar trabalho, já que tenho o 12.º ano e sou técnica de acção educativa”, conta. “Tenho estudos, procuro emprego, porque não me chamam então?”, interroga-se. Adília confessa-se tímida e com uma postura reservada, “provavelmente provocada pelos medos”, e começou a questionar se a falta de oportunidades seria “uma questão de imagem”.

Trabalhar a imagem é precisamente a principal incumbência desta associação, que procura primeiro perceber as dificuldades de quem lhe chega, “tentando evitar que essas mulheres caiam numa espiral depressiva, para depois trabalhar a sua autoestima e resiliência”, conta Teresa Durão, vice-presidente da Dress for Success Portugal.

Inspiração em Oprah Winfrey

O projecto Dress for Success nasceu há 18 anos nos EUA – após uma campanha de recolha de roupa no popularíssimo programa de Oprah Winfrey – e foi trazido há três anos para Portugal pela mão de Fernanda Machado. Além de melhorar a imagem, a associação procura também aumentar as competências e a confiança das desempregadas, para “que não caiam numa situação mais complicada”, defende Teresa Durão.

E Teresa sabe do que fala. Após 16 anos a trabalhar na área jurídica de um banco, com “uma remuneração muito elevada”, viu-se, de repente, na dependência de um subsídio e com a vida “virada do avesso”. Compreendendo que seria difícil voltar às funções que exercera, Teresa Durão foi à procura de um trabalho que a preenchesse e voltasse a dar sentido a uma vida agora vazia. “Tirei um mestrado em gestão de organizações sociais e entrei como voluntária para a Dress”, conta. “Acho que a imagem, não no sentido fútil, mas de transmissão de força e ultrapassagem das fragilidades, é muito importante”, acrescenta. De voluntária, Teresa Durão passou a braço direito da fundadora, sendo actualmente um dos membros mais activos da Dress for Success.

Funcionando como um franchisado social, a associação ainda só existe em Lisboa, mas o objectivo é replicá-lo noutras zonas do país. A funcionar nas instalações da Junta de Freguesia de Santo António, perto da baixa lisboeta, a Dress for Success recolhe a roupa de campanhas que faz junto de empresas e ainda de doações particulares. Após uma triagem, as peças que não se adequam são cedidas a outras instituições. As outras, ficam expostas na boutique, como em qualquer loja da moda.

A roupa é cedida a título definitivo, não só para entrevistas de recrutamento, mas também a quem não tem dinheiro para comprar roupa para ir trabalhar ou tirar um curso. E são já mais de 700 as mulheres ajudadas pela Dress for Success. “Essas pessoas recebem roupa gratuitamente até receberem o primeiro salário ou até que a formação termine”, explica a vice-presidente.

O processo começa com um telefonema, onde é marcada uma entrevista com a coordenadora da boutique. As interessadas explicam, em detalhe, a sua situação e o que pretendem fazer a seguir. Diagnosticadas as necessidades, segue-se um aconselhamento de imagem e a fase da orientação. “É importante que as pessoas se focalizem, em vez de disparar em todos os sentidos”, explica Teresa Durão. “Tentamos que melhorem a sua atitude, apesar da dificuldade da situação, e que tenham uma mentalidade construtiva”, adianta.

Do zero à criação de um negócio

Jennifer, 22 anos, ainda está a tentar trabalhar estes aspectos. Soube do projecto através da Junta de Freguesia e veio à procura de algo para fazer. Espanhola a residir em Portugal há quatro anos, tem apenas o 9.º ano de escolaridade e muita dificuldade em vencer a timidez.

Os muitos protocolos que a Dress for Success mantém com várias entidades permitem a muitas mulheres como Jennifer tirar cursos de formação de formadores, voltar a estudar e modificar os seus objectivos, de acordo com as novas circunstâncias da vida.

“Recebi uma bolsa para um curso de esteticista, oferecido por uma escola profissional”, revela. “Como tenho muitas dificuldades com a língua portuguesa, penso poder começar a arranjar as mãos das pessoas que conheço e criar o meu próprio negócio”, refere. “A Dress for Success deu-me mais autoconfiança e ajudou a valorizar-me”, acrescenta. Uma valorização que passou também pela fase da formação, com cursos de informática, inglês e gestão de imagem. O passo seguinte é ir para o mercado de trabalho. “Começam a fazer uma procura activa de emprego, com o nosso apoio, e muitas acabam por se empregar”, explica Teresa Durão.

Existem ainda outras vertentes, como o Programa das Fadas, que ensina a desempenhar tarefas domésticas, como passar a ferro, limpar o pó ou cozinhar. “Muitas delas criam o seu próprio emprego desta forma”, revela Teresa Durão. Além disso, quem não tem CV passa a ter e as que têm podem ver o seu curriculum melhorado com a ajuda de uma técnica voluntária da área dos recursos humanos.

Adília é um desses casos. A princípio achou bom demais para ser verdade, mas, passadas as primeiras desconfianças, rendeu-se ao projecto. “São como uma segunda família, um grupo excepcional, que se preocupa realmente em ajudar-nos”, defende. Adília pensa agora em abrir uma loja e ensinar artesanato e croché, artes antigas que aprendeu em Trás-os-Montes, para onde fugiu após o agravamento da situação financeira. “Quando regressei, percebi que havia muita gente em Lisboa interessada em fazer estes produtos, por isso, gostava de ensinar essas artes e dar workshops, talvez até criar um ateliê para depois vender as peças que faço”, conta, esperançada.