Sempre foram (e em muitos casos particularmente por via do acesso à propriedade que habitam) a coluna vertebral do crescimento de muitas economias, mas hoje deixaram de ser a prova de que a chamada terceira via – nem capitalismo selvagem nem socialismo colectivista – poderia funcionar como terá funcionado em alguns países da Europa do Norte, ainda muito marcados pela matriz da social democracia.
Com menos emprego, com menos Estado Social pela via da redução do acesso a serviços públicos anteriormente garantidos, crescem os novos pobres, recrutados especialmente entre a classe média, onde cabem muitos licenciados que já viveram confortavelmente e que agora chegam a fingir que não passam fome e tentam acreditar que a culpa do que está a acontecer é deles, por alegadamente terem vivido acima das possibilidades.
Todos nós tentamos acreditar que isto está a melhorar um pouco, devagarinho, mas a melhorar um pouco. Sabemos que será muito difícil conseguirmos o pleno emprego, mas com os actuais valores de desemprego existentes as perspectivas para a classe média são verdadeiramente assustadoras. Os desempregados de longa duração, na casa dos 50 anos de idade, mesmo quando são altamente qualificados olham para o futuro com angústias nunca antes imaginadas.
Ter emprego já não é garantia de escapar à queda. Numa das últimas estatísticas, quase 15% dos portugueses que tinham trabalho estavam em risco de tornar-se pobres. Mesmo continuando a trabalhar, essa situação distorce a própria ideia de classe média – o exército que alimentava o movimento dos museus, o público dos teatros e das salas de música, os frequentadores dos restaurantes de boa qualidade e até os leitores de certas revistas e de certos jornais, bem como o negócio dos carros de gama média alta, ou o negócio das viagens turísticas.
Muitos destes portugueses suspeitam estar a ser olhados pelos filhos como um fardo pesadíssimo, situação que é mais agravada quando os filhos, grande parte da geração portuguesa mais qualificada de sempre, estão fora do país e sem grande vontade de regressar, apesar do amor que continuam a ter por Portugal. Há muito que se sabe que essa história de amor e uma cabana é coisa que nem nos romances cor de rosa já se consegue acolher.
Não podemos ignorar e devemos tentar evitar este naufrágio anunciado. Quando sabemos que a classe média está a perder terreno, está a perder o emprego, está a perder a casa, está a perder a face e, o que é mais preocupante, está a perder a vontade de dar a volta a esta situação e de reencontrar os caminhos do crescimento e do desenvolvimento equilibrados.
*Presidente da APEMIP, assina esta coluna semanalmente