Pedro Costa Ferreira: ‘É um mito dizer que a Tunísia é mais perigosa’

Presidente da associação dos agentes de viagens (APAVT) lembra que Paris e Londres também tiveram atentados. Sobre o Verão, diz que portugueses e estrangeiros vão viajar mais.

Que expectativas têm para o Verão?

São favoráveis. No incoming [estrangeiros que visitam Portugal], 2014 foi superior a 2013 e tudo indica que este ano será melhor. Esperamos crescer acima de 5% [na receita]. Quanto ao outgoing [viagens dos portugueses], estamos mais satisfeitos, mas não podemos falar de crescimento. O que existe é recuperação. Este ano podemos crescer à volta de 10%. Ainda estamos distantes dos números anteriores à crise, mas são crescimentos razoáveis que explicamos não tanto devido ao maior rendimento disponível, até porque não existe, mas com as alterações na confiança do consumidor, que se reflectem no consumo.

Quais são os destinos preferidos?

No longo curso – até porque há um crescimento na oferta de charters face a 2014 – as Caraíbas vão vender mais, sendo de considerar também Brasil, EUA e Oriente. No médio curso, Cabo Verde será importante, bem como Marrocos. A Tunísia também seria importante. A par, as ilhas portuguesas, os circuitos europeus, com destaque para França, porque a Eurodisney em Paris é um produto muito procurado nas férias, e os cruzeiros. Em Portugal, vamos ter oferta mais disseminada do que em anos anteriores porque o Centro, o Alentejo e o Norte estão na moda e começam a fazer mais parte das férias, mas claro que o Algarve é o destino. Está a ter um crescimento muito grande no mercado interno.

Há grandes operadores turísticos, como a Thomas Cook, a sugerir Portugal em substituição de viagens à Tunísia. Pode haver canalização de turistas para o nosso país?

O turismo é a indústria da paz e sempre que acontece algo deste género [atentados terroristas como o de 26 de Junho, contra um resort turístico, em Sousse] todos perdemos. É evidente que há mais massa crítica de turistas disponível a curto prazo. Mas dizer que vêm para Portugal é um exagero. Não existe uma tabuleta a dizer 'Vão para Portugal'. Essa massa crítica vai ser disputada por todos os destinos e uma parte virá para Portugal. Desse ponto de vista haverá algum impacto positivo de curto prazo. Mas não acredito que seja um impacto positivo a médio prazo. Por outro lado, esse impacto positivo não é por aquilo que aconteceu na Tunísia. É pelo que existe em Portugal: paz social, clima de ordem, bons níveis de acolhimento. Se assim não fosse, os turistas saíam da Tunísia, mas não vinham para cá.

Os portugueses também poderão desistir de ir para a Tunísia?

Fala-se na Tunísia, mas esquecemo-nos de que estas coisas aconteceram em todas as zonas do globo, inclusivamente nas mais desenvolvidas. É um mito dizer-se que a Tunísia é mais perigosa do que Paris, Londres ou Nova Iorque, onde também já morreram pessoas. Há um maior afastamento de curto prazo dos portugueses e até houve o cancelamento, por iniciativa dos operadores, da rota que servia a zona acidentada [Hammamet]. Para já, há um menor nível de reservas e há diálogos para perceber se é possível cancelar ou alterar o destino. Se mais nada acontecer, e se a Tunísia conseguir trabalhar no sentido da estabilidade, os operadores portugueses ainda terão capacidade de manter as operações que tinham delineado. Certamente não com os mesmos resultados, sobretudo nas próximas partidas. Tudo depende de como a situação evoluir.

E para França e Eurodisney?

Não se nota a menor das quebras, até porque o caso mais recente não tem que ver com turistas.

Uma vez que 70% das vendas da TAP em Portugal são via agências de viagens, como comenta a estratégia dos novos donos da companhia, de apostar no Brasil e EUA?

A estratégia ainda está pouco apresentada. Mas da maior ligação aos EUA e ao Brasil resultam enormes oportunidades, até de curto prazo para a Economia portuguesa, por causa da valorização do dólar. Ficámos satisfeitos porque também falam de aviões, de crescimento. Era urgente actuar na TAP. Nunca defendemos que a solução fosse com capital público ou privado. Fazíamos mais questão que fosse apresentada uma solução com um espectro político de apoio maior do que aquele que existiu. Temos muita pena que isso não tenha sido realizado. Mas gostámos que a privatização fosse para a frente porque resolveu um assunto premente. É uma privatização com riscos, como qualquer outra, mas muito maior risco era não a fazer ou não ter uma solução concreta.

A associação dos agentes de viagens assinala 65 anos. Quais os principais desafios do sector?

O maior desafio é sempre a adaptação à mudança. Desde que entrei nesta actividade que a pergunta de quem não está no mercado é “mas as agências de viagens não vão acabar?”'. Há o mito de que a internet as engoliu. Mas há mais agências a abrir e o ritmo de crescimento nos últimos anos é significativo. Claro que não vão continuar todas e que os novos padrões de consumo e de comportamento dos turistas vão obrigar as que querem ficar a mudar. Mas os maiores players da internet na área do turismo são agências de viagens. Vê-se muito dinamismo. Eventualmente, faltará um pouco mais de consolidação no sector. E gostaria de ver novas caras na gestão porque não se muda verdadeiramente se não mudarem as gerações.

A consolidação é positiva?

Sim. Sem isso, em determinadas áreas da comercialização, não se consegue aceder à tecnologia.

ana.serafim@sol.pt