A ideia já vinha a germinar há algum tempo mas foi preciso ser ‘regada’ pela Prefeitura carioca e pelo Comité do Rio 450, que organiza as celebrações do 450.º aniversário daquela cidade brasileira. Finalmente, a parceria com o Azeite Gallo fez o resto. Agora, no seu ateliê em Lisboa trabalha-se nesta obra de 10 metros de altura, coberta por 16 mil azulejos e outros tantos leds, que deverá cruzar o Atlântico em Dezembro, mesmo no fim das comemorações. Mas Joana não está preocupada com prazos. “As obras de arte têm uma característica única que é nunca terem sido feitas antes. Ou seja, estamos a fazer um objecto que não existe, não se sabe como se faz e as indústrias não estão adaptadas a ele porque se dedicam àquilo que é feito repetidamente. Ora quando uma pessoa chega à Viúva Lamego, como foi o meu caso, e diz: ‘vamos fazer um galo de Barcelos!’, eles olham para mim e dizem: ‘um galo não é propriamente uma fachada de um prédio ou uma cozinha!’. E têm razão”.
E assim começou a aventura que implicou, até agora, desenhar azulejos especiais numa forma triangular, numerar e furar cada um deles para que encaixem como um puzzle, inserir leds e ainda garantir que o interior da peça é suficiente grande para guardar os nove quilómetros de cabos eléctricos necessários para pôr este galo a ‘sambar’. “De dia ele é um galo um pouco mais abstracto. Mas à noite as luzes vão fazê-lo sambar com o seu piscar. É uma peça com cores brilhantes e tem muito a ver com a forma como a pop pegou em objectos do quotidiano e os transformou em obra de arte. Em Portugal, é visto como um objecto foleiro, banal, sem grande cultura mas não é verdade: ele resistiu a várias mudanças da cultura portuguesa e mantém-se como um objecto icónico da nossa cultura. Além disso, o galo de Barcelos é também uma presença nas casas do Rio de Janeiro.”, explica a artista, acrescentando que sempre norteou este trabalho pela necessidade de criar uma relação com a população carioca. “Daí eu escolher tam-bém o galo. É um objecto reconhecido como um símbolo popular. Não é o resultado erudito da cultura”.
Mas a relação entre os dois países vai mais longe. Quando o Pop Galo chegar ao Rio de Janeiro, vai ficar ‘pousado’ no Leme, uma zona na extremidade da Praia de Copacabana. “O Leme é um sítio muito bonito. Eu queria relacionar-me de alguma maneira com a praia, por que havia essa ideia de chegada na comemoração do Rio450. Depois este galo tem uma relação com a cidade ao nível dos materiais: o azulejo, a própria simbologia, e até o Azeite Gallo com forte presença no Brasil… No fundo, estamos a fazer uma ponte entre a tradição e a modernidade”, conclui.
Apesar de ainda não estar pronto, este galo já ganhou asas. Não só porque é o primeiro de uma série de três que a artista está a preparar, mas principalmente por que, como Joana esclarece, é o primeiro de uma viragem da sua obra. “Há momentos em que a história nos obriga a alterar o nosso percurso. É exactamente isso que está acontecer com esta peça. Tem implicado processos de produção novos, está a transgredir as regras mas também a acrescentar alguma coisa. Estou a aprender muitas coisas e estamos a conseguir criar algo que vai marcar todo o meu processo artístico no futuro”, garante.
E nem mesmo o facto de o projecto estar próximo daquilo que se poderia chamar de megalómano, a verdade é que a artista concentra as suas energias muito para além dele. Não só porque acabou de inaugurar em Londres uma exposição com 40 peças inéditas, como tem desde Maio, e até Novembro, o seu ‘Giardino dell’Eden’ na Bienal de Veneza. No caso londrino, está presente com a exposição Material World na Galeria Phillips, a qual coincide com o lançamento de uma nova monografia da artista, editada pela Thames and Hudson. Como se não fosse suficiente Joana Vasconcelos ainda apresenta na Phillips uma nova peça da colecção ‘Valkyries’. Já nas ‘Olimpíadas da arte’, como lhe chama, Joana, a convite da Swatch, apresenta a instalação ‘Giardino dell’Eden’, um pavilhão insuflável, que no seu interior guarda um jardim de flores de plástico iluminado com leds. Para completar a peça, que assinala ela própria, os 10 anos sobre a primeira presença da artista em Veneza, Joana Runa concebeu um jardim ‘electro-acústico’ como um “sonho esquisofónico”. Uma instalação muito diferente daquela que apresentou em 2005, o candelabro a que deu o nome ‘A Noiva’. Uma peça de grandes dimensões feita com tampões OB, aço inoxidável, fio de algodão e cabos de aço, que esteve exposta pela primeira vez na discoteca Lux e que, 10 anos depois, é parte da Colecção António Cachola, em Elvas.