Banksy. A rua como planeta criativo

Há mais de uma década que Banksy intriga e delicia o mundo com os seus controversos e satíricos graffitis. Planeta Banksy – o Artista, a Obra e o Movimento que Ele Inspirou compila algumas das suas mais emblemáticas obras e mostra como a street art se popularizou no circuito das artes plásticas graças ao seu…

Em Julho de 2003, quando Banksy montou a sua primeira grande exposição em Londres, o street artist já dava nas vistas entre a cena artística londrina (um mês e meio antes tinha desenhado a capa de Think Tank, dos Blur), mas para o grande público era, literalmente, um anónimo. Depois de Turf War, a mostra que montou num antigo armazém na zona de Hackney, o nome de Banksy começou a ser comentado por outros artistas, celebridades, galeristas, jornalistas e demais opinion makers. 

A propósito dessa exposição, Banksy concordou em dar a sua primeira entrevista, para o jornal The Guardian. Mas até ao fim, o jornalista nunca conseguiu confirmar a identidade do graffiter, confrontando-o com isso mesmo. «Como é que sei que é realmente Banksy?», perguntou. A resposta não tardou: «Não sabe. Não tem nenhuma garantia disso».   

Além dos motivos óbvios – como o facto de o graffiti ser ilegal e punido com prisão -, apostar no anonimato tornou-se uma imagem de marca de Banksy e um dos muitos factores que impulsionaram a sua consagração artística. É incrível como ainda hoje, mais de dez anos depois daquela primeira exposição, não se conheça o seu rosto publicamente, quando toda a gente, mesmo que não o saiba, já viu imagens da sua obra. Elas estão por todo o lado: na tal capa do álbum dos Blur, nas redes sociais, numa qualquer parede nas ruas de Londres, Berlim, Nova Iorque, Cisjordânia ou Belém, e também em museus – basta recordar a retrospectiva, e sucessivo leilão, que a Sotheby’s realizou sem a sua autorização no ano passado, em Londres, com 70 das suas obras. 

O leilão só foi possível porque grande parte dos trabalhos estava na posse do antigo agente do artista e os restantes pertenciam a coleccionadores privados que viram aqui uma oportunidade para rentabilizar o investimento feito há anos, uma vez que cada obra de Bansky vale agora largos milhares de euros. Uma das suas mais famosas e reconhecíveis peças, o mural com dois polícias britânicos a beijarem-se (página seguinte), foi vendida por 418 mil euros no ano passado.    

O que motiva, afinal, todo este culto? O lado activista do artista, primeiro que tudo, com o seu trabalho a passar mensagens políticas e sociais fortíssimas ou a criticar governos, mas também o humor e criatividade para ridicularizar temas como a polícia ou o culto da celebridade. 

Como tantos outros, Bansky começou jovem (no seu caso tinha 14 anos) a desenhar letras estilizadas na rua, depois de um ano escolar miserável, que culminou com a sua prisão por pequenos delitos. O graffiti, contou em 2003 ao Guardian, contribuiu para que se sentisse melhor consigo mesmo, deu-lhe uma voz. A falta de talento para «desenhar com a lata de tinta» obrigou-o a procurar outra forma de comunicar e foi assim que Banksy, comecou a usar stencils (moldes). 

A década seguinte passou-a em Bristol, cidade inglesa com próspera cultura de arte urbana, e quando se mudou para Londres, aos 25 anos, o seu nome já era  respeitado de forma unânime pelos seus pares. A ascensão mediática global segiu-se a Turf War, quando começou a assumir uma postura ainda mais provocatória. 

Sempre com disfarces diferentes, Banksy conseguiu introduzir as suas próprias obras em grandes museus, enganando sempre a segurança. No Louvre, por exemplo, instalou com sucesso uma imagem da Mona Lisa com um smile a cobrir-lhe todo o rosto. Em Nova Iorque, conseguiu deixar o retrato de uma mulher com uma máscara de gás numa parede do Metropolitan Museum of Art. 

Depois destas ‘partidas’, o reconhecimento internacional chegou em Agosto de 2005, quando pintou uma série de imagens marcantes no muro da Cisjordânia. Numa via-se uma menina a transpor o muro levada por balões, noutra aparecia um menino com uma escada encostado à parede. E também havia um homem a puxar uma cortina desenhada na muralha, vendo-se do outro lado uma praia (em cima).

A partir daqui a sua carreira disparou. Tornou-se uma lenda mundial e contribuiu para a ascensão da street art no circuito das artes plásticas. E, com tudo isso, influenciou uma nova geração de graffiters a desenvolver a mesma linguagem activista, controversa e satírica. 

Planeta Banksy – o Artista, a Obra e o Movimento que Ele Inspirou, volume que a Vogais agora edita em Portugal, reúne alguns dos trabalhos mais emblemáticos do artista e coloca-o em diálogo com, lá está, outros tantos nomes que emergiram do seu exemplo. A compilação, a cargo do graffiter nova-iorquino Ket, inclui, entre outros, obras de ADW, Alias, Aiko, Ben Eine, Code FC, Icy e Sot, Hogre, Mogul e P183. «As obras aqui apresentadas centram-se em temas comuns que têm sido explorados por Banksy e outros. Não é surpresa para ninguém que a polícia, os governos e as leis sejam matérias para muitos artistas. A agitação civil, a guerra e a paz são outros temas populares para os artistas de todo o mundo […], bem como as questões de pobreza e do desemprego», explica Ket no prefácio do livro. Mais do que a obra do mais famoso artista urbano da actualidade, hoje em dia já bastante divulgada, Planeta Banksy permite ficar a conhecer alguns dos seus contemporâneos e perceber a pertinência da street art no meio artístico. 

alexandra.ho@sol.pt