Orlando Figes – um olhar sobre a Rússia

Descobri Orlando Figes em Junho do ano passado, em Londres, ao folhear numa livraria de Piccadilly o seu Natasha’s Dance. O título é tirado da cena de Guerra e Paz em que a protagonista, Natasha Rostova, dança com os camponeses. Embarcando no sonho de fraternidade entre ‘grandes’ e ‘pequenos’, ‘aristocratas’ e ‘servos’ quando da invasão…

Desde aí, li mais alguns livros de Figes. Um dos seus primeiros trabalhos de conjunto – A People’s Tragedy – The Russian Revolution 1891-1924 – é a história do desfazer violento dessa unidade, que talvez nunca tenha existido, mas que até à Revolução podia ser imaginada ou romantizada. Já no seu primeiro livro, Peasant Russia: Civil War, publicado em 1989, no ano da queda do Muro de Berlim, Figes defendia que a revolução no campo russo em 1917-18, longe de ser apenas um movimento induzido pelo poder central dos Bolcheviques, tivera muito de espontâneo, de igualitário e de revanchismo social. Isto apesar de os decretos político-económicos dos sovietes e de as notícias da Revolução nas cidades terem sido decisivos para incitar o povo na sua fúria reivindicativa, no ataque às grandes propriedades e aos seus senhores, tal como acontecera nas Jacqueries europeias (as medievais francesas e as do tempo da Reforma e da guerra dos camponeses na Alemanha).

Em A People’s Tragedy, Figes conta a epopeia grandiosa e terrível desses trinta e três anos: da Grande Fome de 1891 até à morte de Lenine, dos anos do fim do czarismo e da revolução aos primeiros tempos dos Sovietes.

O sentido de vingança e compensação histórica por parte dos camponeses contra a aristocracia fundiária foi um dos elementos do ‘Terror Vermelho’. Nas cidades, a ‘vingança social’ exerceu-se de modo permanente, vexatório e às vezes até caricato – pondo aristocratas, banqueiros, altos funcionários e oficiais do Exército a varrer as ruas ou a limpar latrinas.

Perante semelhante panorama, alguns elementos da sobrevivente burguesia ou aristocracia preferiram tentar a sorte nas províncias, onde tinham casas e explorações agrícolas e onde os ‘seus’ camponeses seriam mais dóceis e lhes guardariam ainda alguma lealdade. Alguns conseguiram sobreviver, entregando grande parte das terras à comunidade e ficando com pequenas extensões, para cultivo próprio, junto à casa.

 

Este regime foi sobrevivendo até meados dos anos vinte. Mas com a chegada dos soldados e marinheiros bolcheviques, dos Guardas Vermelhos e da Checka, as perseguições, prisões e mortes tornaram-se regra e acabaram com ele.

Era assim, com Lenine e Trotsky, que tudo começava – mas Estaline preparava já a sua hora.