Realizado pela gerontóloga Rute Monteiro, com o apoio da Confederação da Comunidade Portuguesa no Luxemburgo, o estudo analisou o percurso profissional e social de 35 emigrantes com mais de 60 anos, concluindo que os portugueses estão mais expostos ao isolamento, o que pode potenciar depressão, e têm maiores riscos de vir a sofrer de doenças degenerativas, nomeadamente Alzheimer.
"A doença de Alzheimer tem maior prevalência nos idosos com baixa escolaridade e atividades laborais que não requerem a utilização de capacidades intelectuais", explicou à Lusa Rute Monteiro.
Com uma grande percentagem de emigrantes a trabalhar no setor da construção ou das limpezas, os portugueses estão em situação de risco, porque "a baixa escolaridade e a fraca estimulação resultam em declínio na fase do envelhecimento".
A situação agrava-se pelo facto de a maioria dos reformados não ter atividades de ocupação dos tempos livres, por não terem acumulado "recursos sociais e culturais durante a vida ativa que poderiam ser usados na reforma", devido a um percurso "marcado pela dureza do trabalho e da imigração".
A ocupação dos tempos livres, quando existia, confundia-se com o trabalho: "Os homens trabalhavam ao fim-de-semana, a fazer biscates, e há mesmo mulheres que assimilam o lazer à limpeza da casa ou aos arranjos da roupa dos filhos", explicou a gerontóloga.
Só uma minoria no grupo estudado tem hábitos de leitura ou se dedicou ao associativismo (15%), uma atividade desenvolvida apenas pelos homens.
Por esta razão, para a maioria dos emigrantes portugueses que chegam à reforma, "a única utilização do tempo são as necessidades básicas para sobreviver: o banho, a comida, as compras, as idas ao médico".
"Nenhum me disse que ia visitar um museu, nem conhecem bem o país, porque a vida deles foi completamente centrada no trabalho", disse a gerontóloga, destacando os constrangimentos sócio-económicos de grande parte dos emigrantes desta geração.
"Eles nasceram durante a ditadura de Salazar, quando a escolaridade era muito restrita, especialmente para as mulheres. Algumas das mulheres [do grupo de estudo] tiveram que deixar a escola na primeira ou na segunda classe para tomar conta dos irmãos", explicou.
"Era uma altura em que as classes mais pobres não tinham sequer sapatos, não tinham como responder às necessidades mais básicas. A partir do momento em que emigram, querem resolver estes problemas básicos: dar melhor qualidade de vida aos filhos, construir uma casa, voltar para Portugal".
Mas apesar de terem chegado ao Luxemburgo com o sonho de regressar a Portugal, a maioria acaba por decidir ficar no Grão-Ducado, "onde já vivem os filhos e os netos".
Por essa razão, os portugueses no Grão-Ducado enfrentam também a dificuldade de "serem imigrantes no país onde vão viver a última fase das suas vidas", disse a gerontóloga, sublinhando que as instituições luxemburguesas para a terceira idade não estão preparadas para receber os portugueses.
"Como é que pessoas que não falam bem a língua, que não gostam da comida luxemburguesa, vão ser colocadas num meio exclusivamente luxemburguês? Não é preciso ser-se gerontóloga para perceber isto: se uma pessoa está num sítio assim, não vai participar nas atividades, vai ficar completamente isolada e não vai ter boa saúde mental", afirmou.
O problema vai agravar-se nos próximos anos, alertou Rute Monteiro, sublinhando que o número de idosos portugueses a viver atualmente no Luxemburgo (6.100 pessoas com mais de 59 anos, segundo dados do Statec citados no estudo) pode duplicar na próxima década.
"Se não fizermos nada, dentro de dez anos vamos ter cerca de 15 mil portugueses com mais de 60 anos, e destes, pelo menos dez mil correm estes mesmos riscos", afirmou.
Para a gerontóloga, "as instituições no futuro têm de se abrir mais aos imigrantes" e "apostar na estimulação cognitiva e na integração destas pessoas, com atividades que lhes interessem".
Lusa/SOL