Bissau – não brinquem com as instituições!

Na passada quarta-feira, a tensão em crescendo entre o Presidente da República, José Mário Vaz, e o primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira, conheceu o seu epílogo com a destituição do Governo por parte do Presidente.

Este facto é tremendamente negativo. Depois do golpe militar de Abril de 2012 que inviabilizou a esperada eleição de Carlos Gomes Júnior e perturbou profundamente a vida constitucional do país, foi possível reconstituir um processo de transição em que um Governo acabou por ser eleito democraticamente.

O líder desse Governo e do PAIGC, Domingos Simões Pereira, é um político que deu provas em diferentes tempos e lugares e que muitos portugueses se habituaram a conhecer e admirar como secretário executivo da CPLP. José Mário Vaz, também do PAIGC, foi depois eleito Presidente, ficando os órgãos de soberania em harmonia e tranquilidade. Depois, com o apoio regional e internacional, conseguiu-se afastar da zona de pressão sobre os poderes legítimos os poderes fácticos dos chefes militares golpistas, alguns deles ligados ao crime organizado.

A pouco e pouco, a situação tinha vindo a melhorar, a ponto de despertar outra vez o interesse dos investidores estrangeiros. Portugal esteve na linha da frente desta recuperação da confiança, com o secretário de Estado da Cooperação, Campos Ferreira, muito atento ao problema. E tanto o primeiro-ministro como o ministro dos Negócios Estrangeiros portugueses se deslocaram também a Bissau, dando o seu apoio ao processo.

É, pois, absurdo que alguém tenha usado faculdades constitucionais para cometer um acto que terá graves repercussões internas e externas.

Como disse oportunamente José Ramos-Horta, “não há razão nenhuma para que o primeiro-ministro Domingos Simões Pereira possa ser substituído”. E acrescentou o Prémio Nobel da Paz, com conhecimento de causa, que o papel do Presidente da República é “de conciliador, de reconciliador, de um homem que procura sarar feridas e criar condições de estabilidade, de paz, para que o Governo possa governar”.

Os responsáveis da Guiné-Bissau não entenderam esta mensagem e, depois da história complicada e atribulada que tem sido a sua, e estão a desperdiçar esta segunda oportunidade de levantar o país e de dar algumas esperanças e algum futuro ao seu povo.

Os responsáveis políticos dos modelos democráticos recentes têm que perceber que em países com estruturas nacionais e institucionais frágeis é muito perigoso manipular, fora do contexto, faculdades e poderes institucionais. No caso da Guiné-Bissau, os detentores dos órgãos de soberania estão ligados e a demissão do Governo terá repercussões irremediáveis. Sobre todos e sobre o país.