Os sete riscos da venda do Novo Banco

Depois do fracasso das conversações com a Anbang, o Banco de Portugal (BdP) quer vender o Novo Banco aos chineses da Fosun. O conglomerado liderado por Guo Guangchang dificilmente subirá o valor da oferta, mas está disponível para negociar as cláusulas contratuais se Carlos Costa também flexibilizar as condições de venda.

Há pelo menos sete riscos inerentes à venda do banco de transição, que ditaram o falhanço da primeira ronda negocial e ameaçam agora as negociações exclusivas com a Fosun. As contas, os processos em tribunal, o reforço de capital do Novo Banco depois dos testes de stress do BCE e os lesados do papel comercial são as principais incertezas, mas há outras. A Apollo, que afinal passou a ser a terceira escolha, ainda pode ser chamada a uma ronda de negociações, numa altura em que o cenário de suspensão da venda ganha força.

Prejuízos e valor de balanço

Em dez meses de vida, o Novo Banco acumulou prejuízos de 750 milhões de euros. Mas estas são as contas consolidadas, ou seja, do grupo. Os resultados individuais revelam perdas acumuladas de 1.051 milhões desde 4 de agosto de 2014 e até ao final de junho. Estes são indicadores que preocupam o futuro acionista, numa altura em que o capital próprio do Novo Banco (5.010 milhões) está já muito próximo do valor injetado no banco quando foi criado (capital social de 4.900 milhões). O desempenho da instituição continuará a ser condicionado pela evolução da economia portuguesa, mas sobretudo pelos efeitos da medida de resolução.

Oito mil milhões de crédito em risco

O Novo Banco ficou apenas com os ativos saudáveis do BES, mas continua a ser atormentado pela herança da instituição centenária da família Espírito Santo. O agravamento do risco da carteira de empréstimos do Novo Banco é um calcanhar de Aquiles para os gestores, e o indicador não passa despercebido na mesa de negociações entre o BdP e a Fosun. No final de junho, a instituição de transição tinha quase oito mil milhões de euros de crédito em risco. Um em cada cinco euros de crédito concedido poderá entrar em incumprimento. Os chineses deverão exigir garantias para estes créditos, mas a resistência do supervisor poderá ditar, mais uma vez, reticências ao futuro dono.

BCE e necessidades de capital

O Banco Central Europeu divulgará os resultados dos testes de stress e a avaliação da qualidade dos ativos do Novo Banco em outubro. Perante a incógnita do valor a injetar no banco, a Fosun – tal como aconteceu com a Anbang – quererá descontar no preço final a necessidade de recapitalizar a instituição.

Exigências da concorrência

A alienação do Novo Banco tem de passar pelo crivo de Bruxelas. A Direção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia irá analisar a viabilidade da instituição que resulta da venda. O futuro acionista poderá ser confrontado com a necessidade de aplicar medidas que limitem distorções de concorrência. O plano estratégico e de capitalização futura do Novo Banco é um dos temas importantes em debate nos encontros entre o supervisor e os chineses.

Processos em tribunal

Vender o Novo Banco a preços e condições contratuais aceitáveis implica um acordo relativamente a contingências futuras. “É significativo o risco de litigância envolvendo o Novo Banco”, alerta a auditora PricewaterhouseCoopers nos resultados semestrais da instituição. O BdP não espera que haja encargos para o Novo Banco decorrentes dos processos judiciais, mas essa expetativa não é suficiente para o futuro acionista. A ação interposta pelo Goldman Sachs a reclamar um financiamento de 700 milhões concedido ao BES é o maior processo a amedrontar os candidatos.

Reembolso do papel comercial

A paz social no Novo Banco tem um custo: 530 milhões de euros. Este é o montante reclamado por 2.500 lesados com aplicações em papel comercial de empresas do Grupo Espírito Santo. O BdP já fez questão de esclarecer que o comprador do Novo Banco não terá qualquer obrigação de compensar estes clientes. Mas o futuro dono terá de tomar uma decisão: encontrar uma solução para estes clientes, com o aval do BCE e da Comissão Europeia, ou assistir a protestos que sobem de tom semanalmente e põem em causa os esforços desenvolvidos para recuperar a confiança de clientes.

Recuperar imagem e credibilidade

“A administração e os colaboradores vão continuar a realizar todos os esforços de recuperação da imagem e credibilidade do Novo Banco tendo em vista o aumento do volume de negócios e o acrescentar valor para o futuro acionista emergente do processo de venda em curso”, lê-se nas contas semestrais. Além de se focar em captar mais negócio, o novo dono terá de desenvolver uma estratégia para reforçar o papel do Novo Banco como terceira instituição nacional, com 16,2% de quota de mercado, e banco de referência das empresas.

Custo ou trunfo político?

A venda rápida do banco de transição é uma prioridade para o governador e o Executivo, mas essa opção pode condicionar as cláusulas do contrato e até pôr em causa o sucesso do processo. Irá Passos Coelho permanecer alheado ou poderá intervir como aconteceu na venda do BPN? Para já, alinhados na narrativa, os membros do Governo atribuem ao supervisor, enquanto autoridade da resolução, a responsabilidade de toda a intervenção no BES e escolha do futuro dono do Novo Banco. E, desde o início, o Governo tem insistido que os contribuintes não serão chamados a cobrir qualquer prejuízo com este processo. No entanto, mais recentemente o discurso sofreu ligeiros ajustes. É reconhecido um prejuízo indireto, por via do banco público: a CGD. O valor da fatura será uma incógnita até ao desfecho do processo, que poderá acontecer entre meados e o final de setembro, altura em que o país prepara as eleições legislativas. A coligação poderá até usar o caso como um trunfo político, embora reconhecendo que o Novo Banco terá sido vendido com prejuízo. Já o fracasso das negociações com os três candidatos é o cenário menos desejado, uma vez que terá um custo político para o Governo, que em julho reconduziu o governador e rejeita comparações com o caso BPN. A oposição tentará usar o caso BES como uma arma de arremesso em plena campanha eleitoral.

sandra.a.simoes@sol.pt