A maioria silenciosa (que decide sempre quem ganha as eleições) vota em função dos seus interesses, da perceção de que determinado candidato pode ganhar ou da sensação que lhe inspira. Uma coisa é a opinião pública, outra a opinião publicada. O debate era decisivo por essa razão: a maioria da população não liga à política, não vê debates televisivos, não compra jornais nem faz contas de somar ou subtrair a pretexto de jogos partidários. Esta era a única oportunidade de Passos e Costa se poderem mostrar aos que, a partir de agora, voltarão às suas novelas, aos seus reality shows, ao seu futebol. Agora, só no telejornal.
Por motivos que facilmente se explicam as “sondagens” após o debate foram unânimes. Costa mostrou segurança, demarcou-se de Sócrates e falou diretamente aos portugueses. Cumpriu com eficácia os três objectivos. Foi implacável com José Sócrates e tirou um coelho retórico da cartola (“se está tão preocupado, agora que está em casa, pode ir debater com ele”), que subordinou mediaticamente tudo o que se disse sobre o assunto. E foi metódico e competente na maneira como falou, olhando sempre para a câmara, aos portugueses a quem a vida não sorriu nos últimos anos: pensionistas, classe média, funcionários públicos, desempregados de longa duração, jovens, gente que teve de sair de Portugal, donos de restaurantes, cientistas, enfermeiros, lesados do BES.
Passos Coelho perdeu o debate porque levava a carta de Sócrates mas dela não soube tirar partido. Não o fez por pudor ou por desejar representar o papel de estadista, não sei. Perdeu aí porque para ganhar teria de ser um político confiante com o seu percurso, orgulhoso com trabalho do governo, agressivo com o legado socialista e implacável com Costa. Deixou o campo aberto para que o secretário-geral socialista pudesse provar ao país que é uma alternativa de poder, que está preparado. Passos desvalorizou Costa, como Sócrates desvalorizara Passos em 2011. O exercício do poder traz consigo a perda de referências com a realidade, o combate político torna-se menos presente, todos os líderes ao fim de alguns anos desvalorizam os adversários e acabam derrotados por eles.
António Costa ocupará as ruas. Não desaproveitará a oportunidade de o fazer, de ter acções de campanha junto das pessoas. A coligação não o poderá fazer, as ruas tornaram-se lugares perigosos, em cada esquina há lesados, desempregados, sindicatos e taxistas. Passos Coelho poderá ganhar as eleições? O caminho estreitou-se. Para que tal aconteça algo terá de suceder. Uma entrevista de José Sócrates? Talvez. É provável que voltem a sair notícias comprometedoras que o façam sair da toca. A coligação precisa de um Sócrates irritado, explosivo, do velho e tonto animal feroz. Ou então que aconteça algo de ainda mais inesperado.