Boicote aos estrangeiros

A cobertura da campanha eleitoral portuguesa nos jornais estrangeiros está comprometida, uma vez que os líderes dos principais partidos não estão a dar resposta aos pedidos de entrevista dos correspondentes estrangeiros em Portugal.

Alison Roberts, presidente da Associação da Imprensa Estrangeira em Portugal (AIEP), refere ao SOL que os jornalistas estrangeiros “estão muito desiludidos” por não conseguirem ter acesso aos principais protagonistas do debate pré-eleitoral. “Não tem havido consciência de que a imprensa estrangeira também é uma peça fundamental do contacto com as pessoas”, sustenta a presidente da AIEP.

Menor acesso desde o resgate

Para Alison Roberts, o acesso aos políticos portugueses diminuiu acentuadamente desde o pedido de resgate financeiro. Antes disso, era “relativamente fácil” entrevistar um político para os grandes jornais que contratam o serviço de correspondentes em Portugal, como o New York Times, o El País, o Le Monde, a BBC e o Financial Times.

“Sempre tivemos contacto fácil com os políticos, incluindo Durão Barroso”, diz Alison, recordando que essas entrevistas  aconteciam tanto durante campanhas eleitorais como durante os mandatos. Aliás, uma longa entrevista de José Sócrates ao El País, em 2005, enquanto primeiro-ministro, onde revelou dados pessoais e falou sobre a política externa portuguesa, foi criticada em solo nacional por ter sido mais reveladora do que as entrevistas aos media em Portugal.

‘Mandem um e-mail’

Javier Martin, o atual correspondente do El País, entrevistou António Costa há dois meses para aquele diário espanhol, mas salienta: “Preciso de falar agora com ele. A situação é de campanha e isso é totalmente diferente”.

Marie-Line Darcy, correspondente francesa e vogal da direção da AIEP, refere que enviou a 31 de Agosto um e-mail a pedir entrevistas e que até agora não conseguiu que nenhum candidato marcasse datas. E os contactos telefónicos com os assessores de imprensa dos principais partidos “também não dão em nada”:  “Pedem para mandarmos um email”, revela Marie-Line Darcy.

Alison Roberts, correspondente inglesa freelancer que trabalha com a BBC, salienta que a direção da AIEP envia pedidos aos políticos para encontros com grupos de jornalistas, “o que é uma maneira eficaz de os líderes falarem com vários países ao mesmo tempo” – mas esses eventos não têm sido entendidos como prioridade pelos responsáveis das campanhas.

“Fazemos esses encontros com frequência. Ainda hoje, a associação recebeu dois analistas políticos e tivemos 15 correspondentes a fazer perguntas sobre as eleições”, comentava Alison na quarta-feira.

A AIEP conta com mais de 50 jornalistas inscritos que trabalham para agências noticiosas e jornais estrangeiros, funcionando a sede da associação no Palácio Foz, numa sala colocada à disposição de qualquer correspondente pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Embora os políticos portugueses descartem a imprensa internacional, o interesse dos leitores estrangeiros sobre Portugal não pode considerar-se mínimo. Esta terça-feira, Peter Wise escreveu um artigo para o Financial Times em qual analisava a vontade de Passos Coelho ser “o primeiro chefe de Governo da União Europeia a ser reeleito após um resgate”, vendo em Portugal “a antítese da Grécia”.

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