Independência: Catalães vão hoje às urnas para votar

Mais de cinco milhões de catalães são esperados hoje nas urnas para as eleições autonómicas mais importantes da história da região. É essa a interpretação do atual presidente da comunidade, Artur Mas, que lidera as sondagens com uma coligação que garante avançar para a independência em caso de vitória. 

Em Madrid, o Governo conservador de Mariano Rajoy insiste que apenas está em jogo a composição de um parlamento e governo regionais e não um referendo à independência. Mas tanto o seu envolvimento na campanha como os recados que chegam de dentro e fora do país mostram que, mais do que nunca, o risco da separação é real.

Menos de um ano depois do plebiscito independentista não reconhecido por Madrid, Artur Mas juntou a ‘sua’ Convergência Democrática da Catalunha (CDC) à Esquerda Republicana Catalã (ERC) numa “candidatura pela soberania que deixa claro, no primeiro e destacado ponto do programa, que cada voto pressupõe um pronunciamento favorável à independência da Catalunha”.

Se conseguir a maioria no Parlamento catalão, a Aliança Junts Pel Sí (Juntos pelo Sim) propõe-se “redigir um texto constitucional no prazo aproximado de 10 meses” e garante que o processo “não ficará em nenhum caso condicionado por eventuais impugnações de vigência jurídica”.

O homem que lidera o Governo regional desde o final de 2010 assegura que “a declaração unilateral será um último recurso” e vê como “possibilidade remota” as próximas eleições legislativas espanholas, a celebrar até ao final do ano, levarem à formação de um Governo que “aceite a realização de um referendo vinculativo”. Se isso não acontecer, o programa da coligação esclarece que o Governo regional sujeitará a sua proposta de Constituição à avaliação dos catalães e promete que “o resultado positivo nesse referendo permitirá a proclamação da independência”, mesmo contra a vontade de Madrid.

Este processo será iniciado caso a lista de Mas seja vencedora “e o conjunto de listas que defendem a independência somam maioria de deputados”, explica o presidente da Generalitat. Uma posição controversa, já que as sondagens indicam que, com os votos da Candidatura de Unidade Popular (CUP), os independentistas devem obter maioria de deputados mas não de votos: “A lei diz que temos de contar deputados, eu trocaria as eleições por um referendo, pois queria contar votos”, desafia Mas. Outro fator a ter em conta no domingo é a resistência da CUP à figura de Mas, com o líder Antonio Baños a defender que “é insultuoso para o independentismo que se reduza o processo à figura do presidente” e a garantir que o seu partido “votará contra” um novo Governo presidido pelo líder da CDC.

Entre os que defendem a manutenção da região no Estado espanhol, a campanha foi marcada pela presença constante das mais importantes figuras da política nacional. O primeiro-ministro Rajoy encerra hoje em Barcelona a campanha do PP, naquele que será o seu terceiro comício na região na última semana. Rajoy aposta pela maioria silenciosa e não se cansa de apelar ao voto: “Têm de votar para acabar com o pesadelo, para que ninguém vos imponha a definição de bom catalão”.

Já os socialistas do PSOE e a esquerda do Podemos (que concorre na coligação Sí que es Pot) juntam as críticas a Mas aos ataques a Rajoy: “Fiquem connosco e afastaremos Rajoy todos juntos”, defendeu Pablo Iglésias esta semana ao ligar o surto independentista ao descontentamento face ao Governo de Madrid. A esquerda nacional espanhola acena com alterações constitucionais que garantam mais poderes ao governo catalão sem quebrar a unidade de Espanha.

Um argumento que não parece convencer os nacionalistas, escaldados com Madrid devido à reação ao referendo de 2014 e às chantagens que se somaram durante esta campanha, vindas de dentro e fora do país. “Seria a enésima estratégia do Estado para dissolver o independentismo”, acusa Antonio Baños, que também recusa o cenário de catástrofe económica projetado por Madrid: “As reformas ficarão garantidas, a dúvida seria se estariam com Espanha, já que o Governo do PP gastou 50% do fundo de reservas”.

As pensões são apenas um exemplo de tudo o que a Catalunha pode perder, segundo os opositores da independência: a região sairia “automaticamente” da Zona Euro, advertiu esta semana o governador do Banco Central de Espanha na sequência de nova declaração da Comissão Europeia a alertar para o facto de a Catalunha perder o estatuto de Estado-membro em caso de secessão. Várias empresas, incluindo dois dos principais bancos catalães, já ameaçaram abandonar a região em caso de independência e até o líder da Federação Espanhola de Futebol veio lembrar que o “Barcelona ficaria excluído das competições espanholas”.

Pressões que chegaram a ultrapassar as fronteiras da UE quando Barack Obama disse junto ao Rei de Espanha que pretende “manter uma relação com uma Espanha forte e unificada”. Declarações semelhantes às do britânico David Cameron, da alemã Angela Merkel ou até do independentista escocês Alex Salmond, que lembrou a “diferença chave” que representa o facto de o voto independentista não ter o acordo de Madrid, ao contrário do referendo escocês acordado com Londres.

Notícia atualizada às 11h29 

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