Ricciardi: ‘Tem de haver um acordo para pagar aos lesados’

Ex-presidente do BES Investimento considera que o recurso aos tribunais não é uma opção para quem perdeu dinheiro com o papel comercial do GES. Defende um acordo entre Banco de Portugal, CMVM e Novo Banco e um plano de pagamentos.

Os lesados do papel comercial não  deviam ter sido já reembolsados?

A solução para os lesados do BES não pode passar pelos tribunais, porque os processos vão durar muitos anos, e a maioria das pessoas já tem uma idade avançada. A solução tem de passar por um entendimento entre Banco de Portugal (BdP), CMVM e Novo Banco. Tem de se encontrar uma solução. E tudo farei para encontrar uma solução.

Que solução pode ser essa?

Tem de ser uma solução razoável. Estão em causa 500 milhões de euros. Dizem-me que, a partir de certo montante, 80% das pessoas ficam com a situação resolvida. Os outros 20% resolvem parcialmente a sua situação – e estas são pessoas com posses mais elevadas e que podem esperar o ressarcimento do resto. Acho que há maneira de resolver isto, tem de se encontrar um acordo. Os processos em tribunal são complexos e morosos e não são solução para ninguém, sobretudo neste caso em que as pessoas estão a passar por enormes dificuldades.

Mas há um desentendimento entre os reguladores, que até foi invocado pelo primeiro-ministro para sugerir aos lesados recorrerem aos tribunais…

Essa é a opinião do senhor primeiro-ministro. Estão a ver como não há complôs? Ele talvez não vá gostar nada do que estou a dizer,  mas acho que essa não é a solução, terá de ser outra, obviamente dentro dos sistemas que existem – como o sistema de indemnização aos investidores, aplicado no caso BPP. Tem de ser algo desse género.

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Como comenta o adiamento do processo de venda do Novo Banco?

Acho bem. Não vale a pena esconder que a situação da venda do Novo Banco não é fácil. O adiamento foi muito bem decidido. Estamos em campanha eleitoral, vai sempre achar-se que houve razões eleitorais. Acho que os responsáveis, nomeadamente o BdP, chegaram à conclusão que tem de ser feita uma operação mais flexível. Primeiro, poder vender partes do Novo Banco que não interessam a quem quer comprar, e que podem melhorar os rácios de capital do banco e não exigir ao comprador um capital tão elevado.

Acredita que o banco será vendido por 4,9 mil milhões? Esse valor será recuperado?

Isso não sei dizer. Mas poderá ser uma operação muito mais interessante do que seria nestas circunstâncias. Se chega ou não a esse valor, não consigo dizer. Isto vai ser mitigado porque pode ser comprada só uma parte. Se entretanto o banco, com a gestão do Dr. Stock da Cunha, conseguir vender outras participações, isso diminui o esforço financeiro do comprador no aumento de capital. Tudo isso melhorará a situação do Fundo de Resolução.

Vender atividades no exterior é uma das opções?

Não sou eu que vou dizer quais os ativos. Só posso dar exemplos. O Novo Banco tem um banco em Macau, em Paris, em França, na Venezuela e Moçambique. Tudo isso pode ser ‘não-core’ para o adquirente e representar um esforço menor de aumento de capital, o que significa um maior pagamento ao Fundo de Resolução.

E pode ser uma venda parcial?

Sim, o comprador pode não ter de comprar logo 100% do Novo Banco. Quando o valor da aquisição é menor, porque se compra só metade numa primeira fase, há um número maior de potenciais investidores. O capital não é assim tão fácil de encontrar como isso. Com a alternativa de o restante poder ir para o mercado de capitais numa fase subsequente. Isto permite flexibilizar muito mais e trazer mais interessados à operação do que os poucos que estavam, em que nenhum era do setor.

É aconselhável o Novo Banco ser comprado por outro banco?

É melhor para o futuro do Novo Banco. Com a flexibilização, há uma maior probabilidade de aparecem mais concorrentes para fazer um melhor negócio para o Fundo de Resolução e o país. Além disso, é necessário que tenha vocação. E há outro aspeto importante: estão a decorrer testes de stresse e é melhor fazer uma operação sabendo exatamente quais os resultados. Agora há uma margem maior de incógnita. O comprador, quando não tem a certeza do que vai comprar, tem  tendência para baixar o preço. Foi uma belíssima decisão e estou convicto de que vamos conseguir concretizar uma operação muito positiva.

Defende uma maior consolidação no setor bancário?

Salvaguardando problemas de concorrência, que são sempre difíceis num mercado estreito, a consolidação tem de acontecer. A banca comercial é hoje uma atividade que tem de ter escala. Para ser rentável, tem de ser extremamente eficiente e ter custos mais baixos. Se é a consolidação do banco A com o banco B ou do banco B com o C, isso não sei, têm de ser os acionistas das diferentes instituições a decidir.