Eleições: alguns ensinamentos

Já estou habituado a votar sem ser em minoria, pelo que não me surpreende ter acontecido outra vez. Só que agora pensava estarem as pessoas com algumas coisas demasiado presentes, para ainda assim, apesar de terem abandonado em massa a coligação governamental, esperar que abandonassem ainda mais. Neste aspeto, sinto-me um cristão incorrigível, rodeado de…

Vamos então aos ensinamentos destas eleições:

A coligação PàF, como previam todas as sondagens (podiam estar enganadas no pormenor, mas indicavam uma tendência unânime), ficou à frente. Conclui-se que ficando tão pouco à frente, e pelo que desceu, se não tivesse aparecido unida, o PSD estaria atrás do PS. O PSD tem portanto razões para festejar (Paulo Portas também, e talvez mais ainda, porque nunca teria chegado onde chegou pelos seus próprios meios, e só assim se explica aquele contentamento destemperado dos seus dirigentes; já não se explica o mesmo contentamento nos do PSD, como se viu em Passos, depreendendo-se que outros demasiado satisfeitos não compreenderam o que se passou).

As sondagens davam a PàF em primeiro, mas indicavam que os inquiridos não gostavam de Passos para primeiro-ministro. A direção da sua campanha, percebendo isso, fez Passos aparecer apenas em campanha de ruas (onde se mobilizam mais as estruturas partidárias do que se conquistam votos), e o menos possível em debates. Viu-se que acertou. Só que a Constituição, pelos resultados, define que ele será o primeiro a ser chamado a formar Governo (ainda por cima, agora, com a bênção de Costa).

Nesse aspeto, o pronunciamento dos inquiridos nas sondagens (ao preferir Costa para primeiro-ministro, mas não o PS pata vencedor das eleições), não parece facilmente exequível. E porque é que Passos encabeçava o grupo mais votado, mas aparecia pessoalmente como preterido? Porque ainda assim a esquerda, incluindo a que é apelidada de radical, pode ter votantes que apostam em Costa, e porque muitos dos votantes na coligação, embora agarrados pelo voto aos seus partidos, não confiam no primeiro-ministro dos últimos anos.

Costa, tendo afastado Seguro a seguir a uma vitória, por a considerar insuficiente, deveria agora demitir-se, por ter conseguido ainda menos do que Seguro. No entanto, fez um bom discurso pós-eleitoral, e defendeu uma estratégia que parece boa para os seus apoiantes e para os que não gostam de Passos: não obstaculizará o seu Governo, desde que ele se atenha às propostas nacionais do PS, e só avançará para o deitar abaixo quando houver uma alternativa (depreende-se que independente e com apoio parlamentar maioritário). De qualquer modo, tudo indica que Costa terá os dias contados.

Comentadores mais avisados concluíram que os militantes de partido não serão agora bons candidatos presidenciais, porque se necessita em Belém quem seja mais capaz de promover acordos do que confrontos. É necessário portanto um anti-Cavaco em Belém, e que não deve ser muito partidarizado (perdem portanto Rio e Mª de Belém). Não sei se o eleitorado perceberá um pensamento assim, ou se esse pensamento será demasiado sofisticado para apreensão geral (já se percebeu que, apesar de democrata, sou um descrente nos eleitorados). De qualquer modo, estou convicto de que Marcelo Rebelo de Sousa tem, mais do que nunca, tudo a seu favor, se souber avançar por si, rapidamente, e indiferente aos outros. Será mesmo capaz disso? Depois, já não estou certo de que uma pessoa tão inteligente possa ser um bom Presidente. Como dizia Sócrates (o filósofo grego), reforçado por Platão, o conhecimento leva-nos à consciência clara do desconhecimento. Pessoas menos dotadas, são mais convictas: resta terem boas intuições, e serem convictas a avançar com decisões.

Percebe-se agora porque Catarina Martins foi quase unanimemente considerada a grande revelação desta campanha.

Finalmente, acredito nos comentadores, como Luís Marques Mendes, que não acreditam na longevidade deste resultado eleitoral. Tanto mais que Passos, embora muito negociador com o CDS (sobrevivência governamental obrigava a isso), nunca mostrou antes o menor empenho em negociar com o PS (também nunca foi tão necessário, e agora a sobrevivência governamental, para quem quer formar governo nestas condições, também obriga). Mas para já, nem o Presidente cessante, nem o novo nos primeiros tempos, estão em condições constitucionais de convocarem eleições.