O primeiro-ministro abriu a porta do próximo governo ao PS (aceitando o desafio do Presidente), mas não deseja que António Costa aceite – com ele no governo adiaria talvez para sempre a concretização das suas ideias, limitar-se-ia a gerir o dia-a-dia, não é coisa que ambicione. Portas acompanha Passos na abertura aos socialistas, mas ainda menos os quer. Com uma coligação a três teria menos poder, influência e lugares para distribuir. Após ser ultrapassado pelo surpreendente Bloco de Esquerda (como me enganei), o CDS-PP não pode ter mais dissabores.
Quanto ao PS reúne-se com os comunistas e com o BE, mas não os deseja. Sabe que se o fizesse condenar-se-ia a longos anos de cativeiro. O país, moderado na sua essência, jamais aceitaria um golpe de Costa contra a vontade popular expressa em eleições ou uma aliança com partidos fora do sistema. É claro que o secretário-geral do PS abre igualmente a possibilidade de uma aliança com Passos, mas também não a poderá aceitar, deixaria de poder dizer que é uma alternativa, potenciaria o crescimento do Bloco e arriscava-se à irrelevância.
Catarina Martins e Jerónimo de Sousa abrem a porta ao PS, mas querem tudo menos que Costa aceite ultrapassar a sala das visitas. Qualquer acordo com os socialistas implicaria que colocassem em risco o capital de crescimento político e a sua linha ideológica contra um sistema que parece, numa perspectiva marxista, cada vez mais carregado de contradições.
O que pretendem então? Passos e Portas formarem governo e terem garantias parlamentares dos socialistas. Curiosamente, a melhor entre todas as más soluções colocadas à frente do caminho de Costa: viabilizar o governo, mostrar ao país que o PS é responsável e ganhar tempo. Para o Bloco de Esquerda e o PCP o melhor será poderem afirmar que o PS é farinha do mesmo saco, que não há verdadeira alternativa que não passe pelo seu projeto.
Por isso, cuidado. Qualquer coisa que possa ouvir por estes dias não é realmente o que cada um dos atores pretende dizer, é apenas teatro. Uma peça que será levada à cena nos melhores palcos e que durará dois anos, tempo máximo de duração de um governo que o PS fará cair quando achar que o momento é o próprio. Ou quando Passos Coelho e Paulo Portas, cuja estratégia foi até agora brilhante, julgarem ser o tempo ideal.
Um jogo de paciência a que António Costa não resistirá. Aliás, sendo justo, só ainda resiste porque o PS se transformou num deserto sem fim à vista. Medina é ainda uma miragem. E aos meus olhos não há mais nenhuma ‘cidade’ próxima.
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