Divórcios de católicos superam casamentos

Todos os anos mais de 13 mil casamentos pela Igreja acabam em divórcio. Um valor já superior aos 10 mil matrimónios anuais. Apesar de, na última década, as separações entre católicos terem disparado, o número dos que tentaram provar a nulidade do seu casamento, para poderem voltar a casar pela Igreja, é ainda muito residual.…

Os casos são ainda raros, demorados e caros, explicaram ao SOL os vigários judiciais de várias dioceses do País. “Temos em média três processos por ano. A prática religiosa é baixa e as pessoas não estão muito preocupadas com isso”, admite o cónego Alfredo Dionísio, responsável pelo tribunal eclesiástico de Coimbra, acrescentando que “quando vêm regularizar a situação as pessoas já recasaram civilmente”.

No tribunal eclesiástico, os crentes alegam imaturidade, dizem que “tinham uma ideia errada sobre o casamento ou que casaram levianamente”, acrescenta João Martins Marques, vigário-judicial de Viseu, onde entram em média oito casos por ano. Outro dos argumentos dados por quem quer anular o acto é o de que um dos membros do casal não estava em condições psicológicas de assumir um compromisso.

Em Leiria-Fátima há uma média de dez casos por ano; na zona sul (Évora, Beja e Algarve) cinco. Nas maiores dioceses, os números são mais elevados e têm vindo a subir. Em Lisboa, entraram no ano passado 66 casos – mais 11 do que em 2013 – e no Porto correm atualmente cerca de 50.

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Porque desconhecem esta opção ou “não desejam remexer num passado doloroso” – que pode envolver traição, abandono e até violência – a maioria dos católicos que voltaram a casar não recorre a esta via. Vivem numa situação irregular perante a Igreja que vê a sua segunda união como adultério. Não podem confessar-se e comungar nem ser catequistas ou padrinhos de batismo.

Voltar a comungar

Foi para resolver a situação destas pessoas que o Papa abriu um enorme debate com o Sínodo da Família, que terminou esta semana em Roma. Após uma acesa discussão entre progressistas e conservadores, as conclusões apontam para uma abertura da Igreja nesta matéria, embora não total, como muitos reclamavam. Por um lado simplificou-se a via da nulidade matrimonial, através de um documento já publicado pelo Papa que torna o processo mais rápido, barato e simples. Por outro, abriu-se um via nova para os recasados cujo matrimónio não pode ser invalidado poderem regularizar a sua situação perante a Igreja e, em última instância, passarem a comungar na missa. O sínodo chamou-lhe “via do discernimento” e consiste numa avaliação caso a caso do percurso do divorciado. Por exemplo, qual a culpa que teve na separação, se tentou a reconciliação e como lidou com os filhos.

Muitos casamentos anuláveis

Apesar de chegarem poucos pedidos de nulidade aos tribunais da Igreja, os especialistas em Direito Canónico estimam que seja elevada a percentagem de casamentos suscetíveis de serem nulos. “Há quem fale em 80% dos casos, porque muitas pessoas casaram sem ter a noção da exigência do matrimónio”, acrescenta o vigário-judicial de Viseu, argumentando: “A mentalidade divorcista instalada fez com que muitas pessoas casassem excluindo o matrimónio como ele é: indissolúvel, para a vida toda. Casaram numa perspetiva de ‘ver se dá’, a dizer que não queriam ter filhos. Isso não é um casamento válido”.

Por isso, quase todos os pedidos de nulidade têm sentença favorável. Os que não têm é por “falta de prova”, explica o Patriarcado. Mas os processos que se iniciam já sofreram uma triagem prévia feita por um padre ou pelo próprio tribunal. E muitas pessoas já constituem advogado especialista em Direito Canónico para as orientar neste processo.

rita.carvalho@sol.pt