Um dia, estava António Raminhos com as suas duas filhas em casa, Maria Rita, de quatro anos, e Maria Inês, de dois, quando decidiu filmar-se a brincar com elas. O resultado foi o habitual: uma birra relâmpago de Maria Rita e uma Maria Inês impávida perante os gritos da irmã e a brincadeira do pai. Depois de mostrar o vídeo à mulher, o humorista decidiu colocá-lo no seu canal de Youtube. Dificilmente imaginaria a repercussão que a cena familiar viria a ter. O vídeo tornou-se viral. E os episódios de vida doméstica tornaram-se numa série, alimentada à medida que as miúdas crescem. As Marias coleciona fãs, com vídeos que têm cerca de meio milhão de visualizações: quando Raminhos, ao assistir a um filme com as filhas, canta por cima das canções, provocando birras monumentais; quando Raminhos dança cada vez que a filha faz uma birra provocando a ira da criança; quando lhes cozinha um bolo e lhes pede que o comam.

Tal foi o sucesso que o humorista quis transportar para o palco aquilo que só tinha existência na internet. E surgiu o espetáculo de stand-up As Marias, com que o humorista anda na estrada há meses, depois de ter esgotado o Teatro Armando Cortez, em Lisboa. No sábado, esteve em palco em Lamego, no domingo, dia 1, em Vila Real. E, na quinta-feira, chega o ponto alto desta digressão: o Coliseu dos Recreios, em Lisboa, onde As Marias será gravado em DVD.

Mas o que é, afinal, As Marias? “Não é bem um monólogo, não é bem stand-up, não é bem teatro. É uma mistura, quase uma espécie de terapia, um workshop para quem quer ser pai ou para quem não quer ser pai. As pessoas geralmente decidem no fim”, explica António Raminhos, que continua a rir-se ao ver os vídeos das filhas, que mostra ao longo do espetáculo. “É como se fosse uma palestra. Tenho um suporte de vídeo e, através de uma apresentação, vou fazendo o trajeto da minha vida, desde os anos 80, a década em que nasci, até à altura em que me tornei pai e nasceram as minhas filhas. Há uma parte só de texto, apenas com algumas fotografias da minha infância, até chegar à parte dos vídeos, na sua maioria inéditos, feitos para o espetáculo. Sempre com apoio em texto, em stand-up”.

E se são muitos os que seguem atentamente as cenas de pai e filhas, e lhe enviam mensagens de apoio, não faltam também os que o criticam, acusando-o de expor as filhas em demasia.”A exposição é sempre questionável, em termos de segurança, visibilidade. Mas neste caso acho que os vídeos têm trazido mais aspetos positivos que negativos. Aquilo que pretendo mostrar é que nos podemos divertir com os miúdos. Claro que às vezes estou a irritá-las, porque me ponho ao nível delas ao brincar. Por isso é que as irrito, porque tenho mais ou menos a mesma idade mental. Mas o que escolho dos vídeos é o pior de tudo, para parecer uma coisa horrível. Recebo mensagens de apoio, a dizer que gostavam de ter um pai como eu, de que a infância tivesse sido assim ou que gostavam de ser esse tipo de pai. É gratificante”.

 Para a frente, António Raminhos vai levar As Marias ao Porto, estando em palco no Teatro Sá da Bandeira no próximo dia 20; e a vários pontos do país, com apresentações marcadas para Aveiro, Ourique, Odemira e Cuba. E a agenda para o próximo ano também já está a ficar preenchida: irá continuar, com Luís Filipe Borges e Marco Horácio, o espetáculo 2 é Bom, 3 é Demais, com apresentações agendadas para Lisboa e para as ilhas, e pela primeira vez, vai apresentar um programa de televisão, um concurso que se irá estrear no Canal Q, A Arena da Mentira. Vai também continuar no 5 para a Meia-Noite e está ainda a trabalhar num projeto, num canal de cabo, que será “uma espécie de talk show, uma coisa muito estranha: vai ser ou muito bom, ou muito mau, ou tão mau que vai ser bom”.

Fotografia de Miguel Silva/SOL

rita.s.freire@sol.pt